Centrado no tema da
iluminação, tanto em sentido literal quanto – e principalmente – espiritual, este
poema de Hecht alude aos anjos, símbolos que consigo trazem a luz solar do
Éden, um cenário de perfeição e de harmonia de onde mana a fonte de beleza,
sabedoria e esperança, capazes de transmutar a escuridão e trazer vida nova.
O poeta
norte-americano emprega uma suntuosa paleta de metáforas e referências
simbólicas para entrelaçar elementos religiosos, naturalísticos e artísticos:
numa atmosfera mística, surge o recém-nascido envolto em manto de negror, tal
como os brotos dos crocos que lutam para emergir da neve que os rodeia, descortinando
o roteiro capaz de nos trasladar do meramente terrenal e mundano ao celestial e
divino, renovando-nos ainda que sob as condições mais adversas.
J.A.R. – H.C.
Anthony Hecht
(1923-2004)
Illumination
Ground lapis for the
sky, and scrolls of gold,
Before which
shepherds kneel, gazing aloft
At visiting angels
clothed in egg-yolk gowns,
Celestial tinctures
smuggled from the East,
From sunlit Eden, the
palmed and plotted banks
Of sun-tanned Aden.
Brought home in fragile grails,
Planted in England,
rising at Eastertide,
Their petals cup
stamens of topaz dust,
The powdery stuff of
cooks and cosmeticians.
But to the
camel’s-hair tip of the finest brush
Of Brother Anselm, it
is the light of dawn,
Gilding the hems, the
sleeves, the fluted pleats
Of the antiphonal
archangelic choirs
Singing their
melismatic pax in terrain.
The child lies
cribbed below, in bestial dark,
Pale as the tiny tips
of crocuses
That will find their
way to the light through drifts of snow.
In: “The Darkness and
the Light” (2001)
A Sagrada Família
(Rembrandt: pintor
holandês)
Iluminação
Lápis-lazúli pulverizado
pelo céu e volutas de ouro,
Ante os quais os
pastores se ajoelham, mirando no alto
Os anjos visitantes enroupados
com túnicas vitelinas,
Tinturas celestiais contrabandeadas
do Oriente,
Do ensolarado Éden, das
orlas projetadas com palmeiras
Do adusto Áden ao
sol. Trazidos a casa em frágeis cálices,
Plantados em
Inglaterra, brotando ao tempo da Páscoa,
Suas pétalas guarnecem
estames de topázio granulado,
A matéria
pulverulenta de cozinheiros e cosmetólogos.
Mas pela ponta de
pelo de camelo do mais fino pincel
Do Irmão Anselmo, ela
se torna a luz do amanhecer,
Dourando os debruns,
as mangas, as pregas estriadas
Dos coros
arcangélicos e antifonais
Que entoam a sua
melismática pax in terrain.
A criança jaz embaixo
no berço, numa ominosa escuridão,
Pálida como as
diminutas pontas dos crocos
Que entre montes de
neve hão de se orientar até a luz.
Em: “A Escuridão e a
Luz” (2001)
Referência:
HECHT, Anthony. Illumination.
In: __________. Collected poems of Anthony Hecht: including late and
uncollected work. 1st ed. New York, NY: Alfred A. Knopf, 2023. p. 470.
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