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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sábado, 14 de dezembro de 2024

Fiama Hasse Pais Brandão - A Ideia de Árvore que Pertence ao Arbusto

A partir da metáfora que lhe vai no título, este poema de Fiama poderia, s.m.j., ser interpretado como a busca de uma revalorização do aparentemente pequeno e desdenhado, pois que a verdadeira essência, de algo (a exemplo do teatro português, cuja história a voz lírica desaprova) ou de alguém, poderia residir exatamente naquilo que comumente se considera menos relevante, dando um giro libertador à perspectiva que se tem da realidade.

 

Aquilo que se nos apresenta, de um lado, como enleado à natureza, e de outro, como um construto da cultura e das convenções sociais, incorporam-se ao cadinho da imaginação, imaginação essa que, alheia às balizas da filosofia estabelecida, ou mesmo da semântica e dos significados ditos convencionais, pode muito bem desatar o corpo e a mente para novas propostas, mais livres e espontâneas em relação ao meramente racional, centradas nas sensações do mundo, sem maiores zelos pela melhor acepção com que as coisas devem ser tomadas, tampouco pelos propósitos que lhe são correlatos.

 

J.A.R. – H.C.

 

Fiama Hasse Pais Brandão

(1938-2007)

 

A Ideia de Árvore que Pertence ao Arbusto

 

Enquanto o pio pertence à própria ave esclareço

que me vieste libertar da apropriação das coisas próprias,

da atribuição dos denominadores às coisas, da técnica

flagrante de meditação. A imaginação serena,

depois de que o sabor me fez suspender

a Natureza para a nova proposta da cultura.

Fechei o olhar, e tudo o que esplende e passava

pela paleografia, a minha secreta fase, ordena

que para além da volúpia da insignificância

da significação, embora lhe chamem semiótica,

eu designe o meu corpo infiel à filosofia e fiel a ti mesmo.

Deste modo procurei descrever a linha radial dos arbustos

que hoje posso colocar imediatamente como numa écloga: falo-te

segundo a lei da variação onomástica do género pastoral,

em nome do teu nome. Distingo-te do tom de Piério

com a maior exaltação de um amante. O amor tende

e distende o júbilo da periferia desta folha túmida,

é o conjunto da minha consciência do teu corpo

e da minha abjuração

da história do teatro português, enquanto a figura de árvore

pertence àquele arbusto.

 

Em: “Novas Visões do Passado” (1975)

 

Podocarpus Latifolius e Trepadeiras

em Perie Bush (ZA)

(Marianne North: artista inglesa)

 

Referência:

 

BRANDÃO, Fiama Hasse Pais. Obra breve: poesia reunida. Prefácio de Eduardo Lourenço. Lisboa: Assírio & Alvim, 2006. p. 193-194.

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