Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

segunda-feira, 30 de dezembro de 2024

Mary Oliver - Uma Coruja Branca Entra e Sai Voando Sobre a Pradaria

Mesmo que a morte seja, indiscutivelmente, o tema principal deste poema de Oliver, suponho que poderíamos tomá-lo como uma metáfora para todos os fins de ciclo – como um ano que se encerra –, quando esperamos entrar numa fase de transição para uma nova forma de ser, mais aprimorada, a espelhar a luz, símbolo maior de uma verdadeira transformação e catarse.

 

O mocho branco é o ícone desse traspasse, não como um termo soturno, senão como um equivalente a um brilho “aórtico”, tudo para denotar a aliança do eu a algo maior, uma fusão com a essência mesma da vida, para além das limitações deste plano terrenal: a beleza, a precisão e a graça com que o mocho aparece e desaparece são como que a elegância e a inevitabilidade dos ciclos em nossas finitas existências.

 

J.A.R. – H.C.

 

Mary Oliver

(1935-2019)

 

White Owl Flies Into and Out of the Field

 

Coming down out of the freezing sky

with its depths of light,

like an angel, or a Buddha with wings,

it was beautiful, and accurate,

striking the snow and whatever was there

with a force that left the imprint

of the tips of its wings – five feet apart –

and the grabbing thrust of its feet,

and the indentation of what had been running

through the white valleys of the snow –

and then it rose, gracefully,

and flew back to the frozen marshes

to lurk there, like a little lighthouse,

in the blue shadows –

so I thought:

maybe death isn’t darkness, after all,

but so much light wrapping itself around us –

as soft as feathers –

that we are instantly weary of looking, and looking,

and shut our eyes, not without amazement,

and let ourselves be carried,

as through the translucence of mica,

to the river that is without the least dapple or shadow,

that is nothing but light – scalding, aortal light –

in which we are washed and washed

out of our bones.

 

Corujas Nevadas

(John J. Audubon: naturalista franco-americano)

 

Uma Coruja Branca Entra e Sai Voando Sobre a Pradaria

 

Descendo de um céu glacial

com seus abismos de luz,

feito um anjo ou um Buda com asas,

era bela e certeira,

atingindo a neve e o que quer que lá houvesse

com uma força que deixou a marca

da ponta de suas asas – a cinco pés de distância –

e o impulso captor de suas garras,

além de uma cissura sobre o que estava se passando

por entre os vales brancos da neve –;

a seguir, ergueu-se graciosamente,

alçando voo em regresso aos pântanos congelados

para ali se esconder, como um pequeno farol,

entre as sombras azuis –

e então eu pensei:

talvez a morte não seja, afinal, a escuridão,

mas tanta luz a enroscar-se à nossa volta –

tão suave quanto plumas –

que de tanto as fitar e fitar, logo nos cansamos,

e fechamos os olhos, não sem espanto,

e deixamo-nos levar,

como se através da translucidez de uma mica,

até o rio que não tem a menor mancha ou sombra,

que nada é senão luz – luz escaldante, aórtica –

na qual somos lavados e lavados

até os nossos ossos.

 

Referência:

 

OLIVER, Mary. White owl flies into and out of the field. In: __________. House of light. Boston, MA: Beacon Press, 1990. p. 79. 

 

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