Nestas linhas, o
poeta escocês nos apresenta uma intrigante situação em que o falante, apesar de
reconhecer a trampa tencionada por seu inimigo, toda ela disfarçada de
hospitalidade, decide aceitá-la por pura compaixão, para não o deixar sozinho:
vestido com zelo para envolver o narrador e fazer com que ele se sinta seguro,
o inimigo logo evidencia o seu torpe estratagema e a sua inépcia ou falta de habilidade
para executá-lo sem erros.
Não deixa de causar
perplexidade ao leitor o fato de que o ente lírico se mantém compassivo em
relação ao seu contendedor, mesmo quando está sendo lesionado: apesar de adjetivado
como um “tolo”, o falante, em sua complacência, assim não age por ingenuidade
ou deficiência cognitiva, senão por uma profunda compreensão da natureza humana
e suas motivações.
De um lado, uma
estratégia limitada, ardilosa e mesquinha; de outro, a indulgência perante a vingança
e a violência: o poeta parece querer nos convencer de que, mesmo em situações
extremas ou mesmo sórdidas, adotar um comportamento compassivo pode muito bem
ser uma resposta válida, a coexistir com o reconhecimento dos danos causados
por terceiros.
J.A.R. – H.C.
Norman Cameron
(1905-1953)
The Compassionate
Fool
My enemy had bidden
me as guest.
His table all set out
with wine and cake,
His ordered chairs,
he to beguile me dressed
So neatly, moved my
pity for his sake.
I knew it was an
ambush, but could not
Leave him to eat his
cake up by himself
And put his unused
glasses on the shelf.
I made pretence of
falling in his plot,
And trembled when in
his anxiety
He bared it too
absurdly to my view.
And even as he
stabbed me through and through
I pitied him for his
small strategy.
Fugindo da Crítica
(Pere Borrell del
Caso: artista catalão)
O Tolo Compassivo
Meu inimigo
convidou-me como a um hóspede.
Sua mesa toda posta
com vinho e bolo,
As cadeiras ordenadas;
ele, para me distrair, tão bem
Vestido, que por sua
causa me deixei compadecer.
Sabia que se tratava
de uma emboscada, mas
Não podia deixá-lo
degustar o seu bolo sozinho
E repor as suas taças
não usadas na cristaleira.
Fiz de conta que caía
em sua trama
E estremeci quando,
em sua ansiedade,
a expôs de forma
demasiado absurda à minha vista.
E mesmo quando me
apunhalava por todos os lados,
Dele me compadeci por
sua torpe estratégia.
Referência:
CAMERON, Norman. The
compassionate fool. In: HEANEY, Seamus; HUGHES, Ted (Eds.). The rattle bag.
1st publ. London, EN: Faber and Faber, 1982. p. 112.
❁
Nenhum comentário:
Postar um comentário