Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

terça-feira, 17 de dezembro de 2024

Jane Kenyon - Natal Longe de Casa

Kenyon aqui nos descreve um quadro vívido do Natal passado em um lugar não habitual – no caso, por provável tratamento da enfermidade de alguém da família –, longe das intimidades reconfortantes do lar, num ambiente exposto ao bulício urbano e à decoração natalina excessiva nas residências próximas, em contraposição às habituais paisagens naturais frequentadas pela falante, com árvores, riachos, colinas e o canto dos pássaros.

 

Resta-lhe a normalidade de passear com o seu cão pelas ruas de Connecticut, oportunidade em que se detém a observar a vida dos vizinhos, as ornamentações do entorno e as ações das pessoas, enquanto aguarda que os correios lhe tragam as correspondências redirecionadas para o novo lugar de destino, para que possa atenuar essa sensação de distanciamento e de descompasso emocional.

 

J.A.R. – H.C.

 

Jane Kenyon

(1947-1995)

 

Christmas Away from Home

 

Her sickness brought me to Connecticut.

Mornings I walk the dog: that part of life

is intact. Who’s painted, who’s insulated

or put siding on, who’s burned the lawn

with lime – that’s the news on Ardmore Street.

 

The leaves of the neighbor’s respectable

rhododendrons curl under in the cold.

He has backed the car

through the white nimbus of its exhaust

and disappeared for the day.

 

In the hiatus between mayors

the city has left leaves in the gutters,

and passing cars lift them in maelstroms.

 

We pass the house two doors down, the one

with the wildest lights in the neighborhood,

an establishment without irony.

All summer their putto empties a water jar,

their St. Francis feeds the birds.

Now it’s angels, festoons, waist-high

candles, and swans pulling sleighs.

 

Two hundred miles north I’d let the dog

run among birches and the black shade of pines.

I miss the hills, the woods and stony

streams, where the swish of jacket sleeves

against my sides seems loud, and a crow

caws sleepily at dawn.

 

By now the streams must run under a skin

of ice, white air-bubbles passing erratically,

like blood cells through a vein. Soon the mail,

forwarded, will begin to reach me here.

 

O Espírito do Natal

(Greg Olsen: pintor norte-americano)

 

Natal Longe de Casa

 

A sua doença trouxe-me a Connecticut.

Pelas manhãs, passeio com o cão: essa parte da vida

está intacta. Quem é que pintou, quem isolou

quem colocou o tapume, quem queimou o gramado

com cal – essas são as notícias na Ardmore Street.

 

As folhas dos respeitáveis rododendros

do vizinho encurvam-se sob o frio.

Ele deu ré com o carro

através do nimbo branco do seu escape

e desapareceu durante o dia.

 

Na transição entre os prefeitos

a cidade acumulou folhas nas sarjetas,

e os carros que passam levantam-nas em remoinhos.

 

Passamos pela casa duas portas abaixo, a que tem

as luzes mais rebeldes do bairro,

um estabelecimento sem ironia.

Todo verão, o seu putto esvazia um jarro d’água,

o seu São Francisco alimenta os pássaros.

Agora há anjos, festões, velas

até a cintura e cisnes puxando trenós.

 

Duzentas milhas mais ao norte eu deixaria o cão

correr entre bétulas e a sombra negra dos pinheiros.

Sinto falta das colinas, dos bosques e dos riachos

pedregosos, onde o farfalhar das mangas da jaqueta

contra os meus flancos mais parece um fragor

e um corvo grasna sonolento ao amanhecer.

 

A esta altura, os riachos devem correr sob uma camada

de gelo, bolhas de ar branco passando erraticamente,

como células sanguíneas numa veia. Em breve o correio,

reencaminhado, começará a chegar-me aqui.

 

Referência:

 

KENYON, Jane. Christmas away from home. In: __________. Collected poems of Jane Kenyon. Minneapolis, MN: Graywolf Press, sept. 2005. p. 151.

 

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