Alguns rostos têm o
poder de nos despertar um certo prazer, por deixarem extravasar o que há de
mais sincero na alma, eis que plenos daquela simplicidade sem derivas que, do
contrário, poderiam encobrir aspectos menos autênticos, certa superficialidade ou
traços estereotipados dos que os detêm.
Veja-se que a falante
se põe em frente a um espelho, afirmando não possuir uma série de traços
negativos em sua personalidade, a sugerir uma defesa ante possíveis julgamentos
injustos, ainda que, tal como se pode deduzir, não se encontre, de fato, sob um
verdadeiro um impasse.
Para aquele que a
tudo observa, sempre haverá alguma apreensão ante o desconhecido, no sentido de
que lhe assalta uma dúvida acerca da fidedignidade de sua percepção perante o
real, inclusive, é claro, diante da própria arte, sempre a suscitar incontáveis
interpretações e significados, ou ainda, ilimitadas possibilidades de atender
ao nosso prazer estético.
“Fico muito ansiosa
enquanto escrevo – tenho dúvidas, nenhuma curiosidade depois – nenhum interesse
na avaliação. Há que se ser complacente. ‘Um Rosto’ soa-me como uma conversa.
Não limito sua implicação ao fazer alusão a um rosto em especial; não é tão longo
que sobrecarregue a atenção; é positivo, uma afirmação – não uma vingança”. (Nota
de M. M. em ENGLE; LANGLAND, 1962, p. 11)
J.A.R. – H.C.
Marianne Moore
(1887-1972)
A Face
‘I am not
treacherous, callous, jealous, superstitious,
supercilious,
venomous, or absolutely hideous’:
studying and studying
its expression,
exasperated
desperation
though at no real
impass,
would gladly break
the mirror;
when love of order,
ardor, uncircuitous simplicity
with an expression of
inquiry, are all one needs to be!
Certain faces, a few, one or two – or one
face photographed by recollection –
to my mind, to my sight,
must remain a delight.
O Espelho
(Sir William Orpen:
artista irlandês)
Um Rosto
“Não sou traiçoeira,
insensível, invejosa, supersticiosa,
arrogante, venenosa ou
absolutamente hedionda”:
estudando e estudando
a sua expressão,
exasperado desespero
ainda que sem
verdadeiro impasse,
quebraria de bom
grado o espelho;
quando o amor pela
ordem, o ardor, a simplicidade sem rodeios
com uma expressão de
indagação, são tudo o que alguém
precisa ser!
Certos rostos, alguns,
um ou dois – ou um
rosto fotografado
pela memória –
em minha opinião, a meu
ver,
devem permanecer um prazer.
Referência:
MOORE, Marianne. A
face. In: ENGLE, Paul; LANGLAND, Joseph (Eds.). Poet’s choice. New York,
NY: The Dial Press, 1962. p. 11.
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