Alpes Literários

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Subtítulo

UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quarta-feira, 4 de setembro de 2024

Delmore Schwartz - Num Leito Nu, na Caverna de Platão

Num quarto que corresponde à metafórica caverna de Platão, o falante insone apreende o que se passa nos arredores da cidade, através dos reflexos vistos nas paredes e dos sons ouvidos pela janela. Quando ele se dispõe a contemplar, de fato, o que há lá fora, percebe a infinita extensão do plano cósmico, e os seus olhos logo se tornam exaustos, forçando-o a retornar para a cama.

 

Sem depreciar a existência desse vasto firmamento, a voz lírica logo se detém a nos revelar o quanto de realidade também há pelo lado interno das paredes do dormitório, ou ainda, sob a sua própria derme – um mundo sensorial, perceptivo, que, identicamente, se projeta como um filme nessa tela alegórica, autêntico fundo a demarcar o caráter nada indulgente da História.

 

J.A.R. – H.C.

 

Delmore Schwartz

(1913-1966)

 

In the Naked Bed, in Plato’s Cave

 

In the naked bed, in Plato’s cave,

Reflected headlights slowly slid the wall,

Carpenters hammered under the shaded window,

Wind troubled the window curtains all night long,

A fleet of trucks strained uphill, grinding,

Their freights covered, as usual.

The ceiling lightened again, the slanting diagram

Slid slowly forth.

 Hearing the milkman’s chop,

His striving up the stair, the bottle’s chink,

I rose from bed, lit a cigarette,

And walked to the window. The stony street

Displayed the stillness in which buildings stand,

The street-lamp’s vigil and the horse’s patience.

The winter sky’s pure capital

Turned me back to bed with exhausted eyes.

 

Strangeness grew in the motionless air. The loose

Film grayed. Shaking wagons, hooves’ waterfalls,

Sounded far off, increasing, louder and nearer.

A car coughed, starting. Morning, softly

Melting the air, lifted the half-covered chair

From underseas, kindled the looking-glass,

Distinguished the dresser and the white wall.

The bird called tentatively, whistled, called,

Bubbled and whistled, so! Perplexed, still wet

With sleep, affectionate, hungry and cold. So, so,

O son of man, the ignorant night, the travail

Of early morning, the mystery of beginning

Again and again,

while History is unforgiven.

 

A Caverna do Desespero

(Benjamin West: pintor anglo-americano)

 

Num Leito Nu, na Caverna de Platão

 

No leito sem coberta, na caverna de Platão,

Reflexos de fachos deslizaram lentamente pela parede,

Carpinteiros martelaram sob a janela ensombrada,

O vento, por toda a noite, agitou as cortinas da janela,

Uma frota de caminhão subiu a colina a ranger,

Com sua carga coberta, como de costume.

Outra vez o teto se iluminou, e o oblíquo diagrama

Deslizou aos poucos adiante.

  Ao ouvir o pregoar do leiteiro,

O seu esforço para subir a escada, o tilintar das garrafas,

Levantei-me da cama, acendi um cigarro

E caminhei até a janela. A rua empedrada

Exibia a quietude em que assentes os prédios,

A vigília dos lampiões e a paciência dos cavalos.

A límpida abóbada do céu de inverno

Fez-me retornar ao leito com os olhos exaustos.

 

A estranheza medrou pelo ar imóvel. O filme em livre projeção

Acinzentou-se. Carroças sacolejantes e cascatas de cascos

Ressoaram ao largo, cada vez mais forte e mais perto.

Um carro baforou, dando partida. A manhã, dissolvendo

Suavemente o ar, ergueu do fundo do mar

O semicoberto assento, iluminou o espelho,

Tornando mais nítidas a cômoda e a parede branca.

O pássaro tentou chamar, silvou, chamou;

De fato, trinou e silvou! Perplexo, ainda úmido

De sono, afetuoso, faminto e com frio. Assim, assim,

Ó filho do homem, a noite ignorante, o árduo trabalho

Da manhã, o mistério de começar

De novo e de novo,

enquanto a História não perdoa.

 

Referência:

 

SCHWARTZ, Delmore. In the naked bed, in Plato’s cave. In: UNTERMEYER, Louis (Ed.). Modern american and british poetry. In two volumes: volume 1 – american. Published for the United States Armed Forces: Education Manual - EM 131. Washington, D.C.: Harcourt, Brace and Company, nov. 1944. p. 692.

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