Alpes Literários

Alpes Literários

Subtítulo

UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quinta-feira, 12 de setembro de 2024

Simon J. Ortiz - Fome em Nova York

Ao expressar a luta e a experiência da fome no contexto de uma cidade grande e próspera – a exemplo de Nova York –, Ortiz busca retratar como a privação, tanto física quanto emocional, encontra barreiras limitantes para saciá-la em meio a um entorno urbano manifestamente conturbado, indiferente e impessoal.

 

A fome é tal como um ser à procura de algo mais que comida, com necessidades emocionais de conexão e de pertencimento, até mesmo de identidade cultural e de responsabilidade perante a comunidade ao redor, longe do que somente restam ao famélico o vazio e a fragilidade anímica – provações essas contra as quais o falante, como forma de consolo e de socorro espiritual, recorre à conexão com a natureza e à despretensão.

       

J.A.R. – H.C.

 

Simon J. Ortiz

(n. 1941)

 

Hunger In New York City

 

Hunger crawls into you

from somewhere out of your muscles

or the concrete or the land

or the wind pushing you.

 

It comes to you, asking

for food, words, wisdom, young memories

of places you ate at, drank cold spring water,

or held somebody’s hand,

or home of the gentle, slow dances,

the songs, the strong gods, the world

you know.

 

That is, hunger searches you out.

It always asks you,

How are you, son? Where are you?

Have you eaten well?

Have you done what you as a person

of our people is supposed to do?

 

And the concrete of this city,

the oily wind, the blazing windows,

the shrieks of automation cannot,

truly cannot, answer for that hunger

although I have hungered,

truthfully and honestly, for them

to feed myself with.

 

So I sang to myself quietly:

I am feeding myself

with the humble presence

of all around me;

I am feeding myself

with your soul, my mother earth;

make me cool and humble.

Bless me.

 

In: “Going For the Rain” (1976)

 

O Homem Faminto

(Emma Visca: artista escocesa)

 

Fome em Nova York

 

A fome rasteja para dentro de ti

a partir de algum lugar fora dos teus músculos

ou do concreto ou da terra

ou do vento que te empurra.

 

Vem a ti, pedindo-te

comida, palavras, sabedoria, frescas memórias

dos lugares onde comeste, bebeste a fria água da fonte,

ou seguraste a mão de alguém,

ou o lar das danças suaves e lentas,

das canções, dos deuses robustos, do mundo

que conheces.

 

Ou seja, a fome te procura.

Pergunta-te sempre,

Como estás, filho? Onde estás?

Tens te alimentado bem?

Tens feito o que se supõe que deves fazer

Como pessoa do nosso povo?

 

E o concreto desta cidade,

o untuoso vento, as janelas flamejantes,

os rangidos da automação não podem,

de fato, não podem responder a essa fome,

embora houvesse desejado,

sincera e honestamente,

que me servissem de alimento.

 

Então, em quietude, cantei para mim mesmo:

alimento-me

com a humilde presença

de todos ao meu redor;

alimento-me

com tua alma, minha Mãe Terra;

torna-me sereno e humilde.

Abençoa-me.

 

Em: “A Caminho da Chuva” (1976)

 

Referência:

 

ORTIZ, Simon J. Hunger in New York city. In: __________. Woven stone. Tucson, AZ: The University of Arizona Press, 1992. p. 85-86.

Nenhum comentário:

Postar um comentário