Ao navegar pelas
águas turbulentas da vida, o falante deste poema entabula um diálogo com os
pares, expressando a sua sensação de incerteza, desespero, privações e
isolamento: dir-se-ia que se encontra em uma crise existencial, pondo em
evidência a fragilidade da existência humana, a desintegração das estruturas
familiares, a erosão de todos os saberes, o degringolar de nossa civilização.
Das metáforas
empregadas por Berryman, muitas ilações se podem depreender: já não há âncoras
em que se segurar, orientações confiáveis de líderes ou mentores a seguir,
conhecimentos e guias acessíveis, trilhas arquetípicas ou narrativas com
sentidos pertinentes frente às circunstâncias imperantes. Em suma: “Tudo o que
é sólido desmancha no ar” – diriam Marx e Engels –, nada é mais estável ou categórico,
pois que insondáveis são os novos desafios impostos pela pós-modernidade.
J.A.R. – H.C.
John Berryman
(1914-1972)
Conversation
Whether the moorings
are invisible
Or gone, we said we
could not tell.
But argument held one
thing sure
That none of us that
night could well endure;
The ship is locked
with fog, no man aboard
Can see what he is
moving toward,
There’s little food,
less love, no sleep,
The sea is dark and
we are told it’s deep.
Where is an officer
who knows this coast?
If all such men long
since have faced
Downward, one summon.
Who knows how,
With what fidelity
his voice heard now
Could shout
directions from the ocean’s floor?
Traditional characters
no more
Their learnt simple
parts rehearse,
But bed them down at
last from the time’s curse.
A broken log fell out
upon the hearth.
The flaming harbinger
come forth
Of holocausts that
night and day
Shrivel from the mind
its sovereignty.
We watched the embers
cool; those embers brought
To one man there the
failing thought
Of cities stripped of
knowledge, men.
Our continent a
wilderness again.
These are conclusions
of the night, we said;
And drank, and were
not satisfied.
The fire died down,
smoke in the air
Took the alarming
postures of our fear;
The overhead horror,
in the padded room
The man who cannot
tell his name.
The guns and enemies
that face
Into this delicate
and dangerous place.
(1938)
In: “The
Dispossessed” (1948)
Tempestade de neve:
Hannibal e seu
exército cruzando os Alpes
(William Turner:
pintor inglês)
Conversa
Se as amarras são
invisíveis ou desapareceram,
Afirmamos que não
saberíamos dizer.
Mas a discussão
nutriu uma certeza
Que nenhum de nós,
naquela noite, poderia bem suportar;
O navio está
bloqueado pelo nevoeiro e ninguém a bordo
É capaz de distinguir
para onde ele se dirige,
Há pouca comida, amor
menos ainda, não se dorme,
O mar está escuro e nos
dizem que é profundo.
Onde encontrar um
capitão que conheça este litoral?
Se todos há muito foram
tragados pelo mar,
Chamem por algum. Quem
sabe como,
Com que fidelidade ouvida
agora a sua voz,
Poderia ele gritar
orientações desde o fundo do oceano?
As personagens
tradicionais já não ensaiam
Os seus papéis mais
simples, há muito aprendidos,
De tal forma que, ao
fim, estes se rendem à maldição do tempo.
Caiu sobre a lareira
um lenho partido.
Um presságio
flamígero revela-se
Dos holocaustos que,
noite e dia,
Emurchecem da mente a
sua soberania.
Vimos as brasas
arrefecerem; brasas que trouxeram,
Para alguém ao largo,
o pensamento falho
De cidades expropriadas
de saberes, de homens.
Nosso continente é
outra vez um deserto.
Essas são as conclusões
da noite, afirmamos.
E bebemos sem que
ficássemos satisfeitos.
O fogo se apagou, a
fumaça no ar
Assumiu as alarmantes
posturas de nosso medo;
Sobre as cabeças o
horror, na sala acolchoada
O homem incapaz de
dizer como se chama.
As armas e os
inimigos que vêm em direção
A este lugar delicado
e perigoso.
(1938)
Em: “Os Despossuídos”
(1948)
Referência:
BERRYMAN, John. The
conversation. In: __________. Collected poems: 1937-1971. Edited and
introduced by Charles Thornbury. 1st print. New York, NY: Farrar, Straud and
Giroux, 1989. p. 22.
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