Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

terça-feira, 2 de julho de 2024

Joachim du Bellay - Soneto XXXI

Bellay expressa nestes versos uma espargida nostalgia da pátria e o desejo de retornar à terra natal, um comum sentimento entre os poetas de sua época, conhecidos por compor a Plêiade, grupo literário do século XVI que buscava valorizar a cultura e o idioma franceses: para tanto, coteja a sua jornada à de heróis antigos, como a de Ulysses, em regresso a Ítaca, ou a de Jasão, de volta para casa, depois de haver conquistado o velo de ouro.

 

De fato, a ideia bem ilustra o padrão das jornadas frequentemente narradas na Literatura, a saber, uma sequência de aventuras gloriosas, regressos ao torrão natal, momentos de serenidade em um quotidiano retirado e o atingimento do que se costuma chamar por “sabedoria de vida”.

 

Não deixa de chamar a atenção o contraste entre as imagens pormenorizadas pelo poeta: de um lado, a grandeza de Roma, materializada por arrojados frontões e palácios; de outro, a simplicidade de uma edificação semianônima, em que se destacam a humilde casa, o cercado, a chaminé fumegante e, por extensão, a pequena aldeia campestre. Ou designadamente, para além dos Alpes, o Tibre latino e o Monte Palatino; mas a noroeste, a pequena Liré, a aldeia provinciana na região de Anjou, França!

 

Em síntese: também de simplicidade sustenta-se o coração humano, vale dizer, do afeto, da conexão com a sua história pessoal e das memórias relativas ao lugar de onde se parte para a grande jornada da vida.

 

J.A.R. – H.C.

 

Joachim du Bellay

Gravura de Charles-Etienne Gaucher

(1522-1560)

 

Sonnet XXXI

 

Heureux qui, comme Ulysse, a fait un beau voyage,

Ou comme cestuy-là qui conquit la toison,

Et puis est retourné, plein d’usage et raison,

Vivre entre ses parents le reste de son âge!

 

Quand reverrai-je, hélas, de mon petit village

Fumer la cheminée, et en quelle saison

Reverrai-je le clos de ma pauvre maison,

Qui m’est une province, et beaucoup davantage?

 

Plus me plaît le séjour qu’ont bâti mes aïeux,

Que des palais Romains le front audacieux,

Plus que le marbre dur me plaît l’ardoise fine:

 

Plus mon Loire Gaulois, que le Tibre Latin,

Plus mon petit Liré, que le mont Palatin,

Et plus que l’air marin la doulceur Angevine.

 

Dans: “Les Regrets” (1558)

 

Beaugency, Vale do Loire

(William Turner: pintor inglês)

 

Soneto XXXI

 

Ditoso o que empreendeu de Ulysses a jornada,

Ou como ess’outro que conquistou a tosão

E que após retornou, com mais tino e razão,

A viver entre os seus a vida descuidada.

 

Quando é que hei de rever de minha aldeia amada

O fumo dos casais; do tempo em qual sazão

Hei de sebe rever da mui pobre mansão

Que uma província me é, a que igual não há nada?

 

Mais me apraz o meu lar avoengo, venturoso,

Que de romano paço o frontão audacioso;

Mais que o mármore duro apraz-me a ardósia fina,

 

O meu Loire gaulês, mais que o Tibre latino,

Mais meu pobre Liré que o monte Palatino,

Mais que a brisa marinha a doçura angevina.

 

Em: “As Queixas” (1558)

 

Referência:

 

BELLAY, Joachim du. Sonnet XXXI / Soneto XXXI. Tradução de Guilherme de Almeida. In: ALMEIDA, Guilherme de (Seleção e tradução). Poetas de França. Prefácio de Marcelo Tápia. 5. ed. São Paulo, SP: Babel, 2011. Em francês: p. 30; em português: p. 31.

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