Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

segunda-feira, 26 de junho de 2023

Roy Fuller - Meditação

O poeta reflete sobre o estado de eversão do império britânico, o que então resultava do agir insolente de seus mandatários frente a emissários de terceiras nações colonizadas – pode-se até mesmo presumir incursões de delegações indianas a Londres –, tudo a fomentar cizânias capazes de deflagar conflitos, armados ou não.

 

A voz lírica se questiona sobre as razões que fundamentam um modo de condução tão jupiteriano de seus pares: em face de “nossas curtas e problemáticas vidas”, quase nada importa, estando elas à mercê de alguma “equação assombrosa ou experiência mística” que as desvende. Ou ainda, como arremata o falante, “estejamos todos mortos em segurança, antes que algo realmente venha a suceder”, como iminente corolário – se poderia aduzir – de um tal regime reprovável de dominação.

 

J.A.R. – H.C.

 

Roy Fuller

(1912-1991)

 

Meditation

 

Now the ambassadors have gone, refusing

Our gifts, treaties, anger, compliance;

And in their place the winter has arrived,

Icing the culture-bearing water.

We brood in our respective empires on

The words we might have said which would have breached

The Chinese wall round our superfluous love

And manufactures. We do not brood too deeply.

There are our friends’ perpetual, subtle demands

For understanding: visits to those who claim

To show us what is meant by death,

And therefore life, our short and puzzling lives,

And to explain our feelings when we look

Through the dark sky to other lighted worlds –

The well-shaved owners of sanatoria,

And raving, grubby oracles: the books

On diet, posture, prayer and aspirin art:

The claims of frightful weapons to be investigated:

Mad generals to be promoted: and

Our private gulfs to slither down in bed.

 

Perhaps in spring the ambassadors will return.

Before then we shall find perhaps that bombs,

Books, people, planets, worry, even our wives,

Are not at all important. Perhaps

The preposterous fishing-line tangle of undesired

Human existence will suddenly unravel

Before some staggering equation

Or mystic experience, and God be released

From the moral particle or blue-lit room.

Or, better still, perhaps we shall, before

Anything really happens, be safely dead.

 

Meditação

(Nilesh Nikam: artista indiano)

 

Meditação

 

Agora os embaixadores partiram, recusando

Nossos presentes, tratados, ira e submissão;

Para substituí-los chegou o inverno

Congelando a água e suas culturas.

Repisamos em nossos respectivos impérios

O que poderíamos ter dito e teria fraturado

A muralha chinesa que cerca nosso amor supérfluo,

Nossas manufaturas. Mas não repisamos demais.

Há os pedidos – perpétuos, sutis – que amigos fazem

Para compreendermos: visitas aos que pretendem

Ter ensinado o que significa a morte

E portanto a vida, nossas curtas e problemáticas vidas,

E explicado nossos sentimentos quando vemos

Através do céu escuro outros mundos iluminados...

Os donos bem barbeados de sanatórios

E de enfadonhos, delirantes oráculos: os livros

Sobre dieta, orações, postura, a arte da aspirina!

O argumento de armas terríveis a investigar,

Generais loucos a promover,

Nossos golfos privados a estender na cama.

 

Talvez na primavera os embaixadores retornem.

E talvez tenhamos aprendido que bombas,

Livros, povo, planetas, cuidados e talvez nossas mulheres,

Nada importam. Talvez

A desordenada linha de pesca da indesejada

Existência humana súbito se desenrede

Ante uma perturbadora equação

Ou uma experiência mística – e Deus seja remido

De qualquer partícula moral ou aposentos azulados.

Ou, melhor ainda, antes que algo realmente aconteça,

Talvez estejamos a salvo, mortos.

 

Referência:

 

FULLER, Roy. Meditation / Meditação. Tradução de Jorge Wanderley. In: WANDERLEY, Jorge (Organização, Tradução e Notas). 22 ingleses modernos: uma antologia poética. Rio de Janeiro, RJ: Civilização Brasileira, 1993. Em inglês: p. 120 e 122; em português: p. 121 e 123.

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