Preliminarmente, uma
observação: embora possa parecer que Juan Gelman esteja a traduzir poemas de um
poeta de presumível origem anglo-saxã, de fato, tudo não passa de um jogo –
talvez para burlar a censura argentina –, pois John Wendell representa somente
mais um dos pseudônimos adotados pelo autor, para poder dar curso ao seu
talento ao longo da ditadura então em curso no país vizinho. De resto, não se ignorem
as marcas indeléveis na biografia do poeta, resultantes das perseguições
políticas que lhe foram dirigidas e a seus familiares.
Infensa aos propósitos
do capitalismo, a poesia, segundo a voz lírica, faz-lhe oposição mediante protestos
nos quais se assume acometida pela dor, quer em razão da fome, quer em face da
sede, quer até mesmo – por mero exercício de rebeldia – para ir de encontro
àqueles que a veem mais como uma resignada e decorosa “maneira de vencer a
morte”.
J.A.R. – H.C.
Juan Gelman
(1930-2014)
XVI
toda poesia es hostil
al capitalismo
puede volverse seca y
dura pero no
porque sea pobre sino
para no contribuir a
la riqueza oficial
puede ser su manera
de protestar de
volverse flaca ya que
hay hambre
amarilla de sed y
penosa
de puro dolor que hay
puede ser que
en cambia abra los
callejones del deliria y las bestias
canten atropellandose
vivas de
furia de calor sin
destino puede
ser que se niegue a
si misma como outra
rnanera de veneer a
la muerte
asi como se llora en
los velórios
poetas de hoy
poetas de este tiempo
nos separaron de la
grey no se que sera de nosotros
conservadores
comunistas apoliticos cuando
suceda lo que
sucedera pero
toda poesia es hostil
al capitalismo
En: “Traducciones I –
Los Poemas de John Wendell”
(1965-1968)
O triunfo da
revolução
(Diego Rivera: pintor
mexicano)
XVI
toda poesia é hostil
ao capitalismo
pode tornar-se seca e
dura mas não
porque seja pobre mas
para não contribuir
com a riqueza oficial
pode ser sua maneira
de protestar de
fazer-se magra já que
há fome
amarela de sede e
sofrida
de pura dor que há
pode ser que
ao contrário abra os
becos do delírio e as bestas
cantem atropelando-se
vivas de
fúria de calor sem
destino pode
ser que se negue a si
mesma como outra
maneira de vencer a
morte
assim como se chora
nos velórios
poetas de hoje
poetas deste tempo
nos separaram do
rebanho não sei que será de nós
conservadores
comunistas apolíticos quando
aconteça o que vai
acontecer mas
toda poesia é hostil
ao capitalismo
Em: “Traduções I – Os
Poemas de John Wendell”
(1965-1968)
Referências:
Em Espanhol
GELMAN, Juan. XVI:
toda poesia es hostil al capitalismo. In: __________. Poesía reunida.
Tomo I: 1956-1980. 1. ed. Buenos Aires, AR: Seix Barral, 2012. p. 232-233.
(Seix Barral ‘Biblioteca Breve’)
Em Português
GELMAN, Juan. XVI: toda
poesia é hostil ao capitalismo. Tradução de Jeff Vasques. In: VASQUES, Jeff
(Pesquisa e Tradução). Poesias de luta na América Latina. Prefácio de Mauro
Iasi e Luis C. Scapi. 2. ed. [s.l.]: [Trunca Edições], 2017. p. 14. Disponível neste endereço. Acesso em: 20 jun.
2023.
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