O poeta que há no
falante – também profeta, panfleta, pateta – afirma-se pela negação a paralelos
qualificados com sentidos despectivos – respectivamente, um burocrata escrivão,
uma cartomante cigana, um jornalista de matéria paga, um esteta sentinela de
valores iluministas –, haja vista que se pretende menos tolhido em seu voo rumo
ao “homem pressentido”.
Percebe-se, desse modo,
um exercício da lírica menos propenso a seguir regras clássicas ou convencionais
– como as insertas em manuais de poética, as quais acabam por confinar o poeta
num jogo de “transpiração” –, pois que os “voos de imaginação” são o que, presumivelmente,
interessam ao enunciador do discurso, com toda a abertura possível ao improviso
que a “inspiração” possa suscitar a cada momento.
J.A.R. – H.C.
Chacal
Ricardo de Carvalho
Duarte
(n. 1951)
o poeta que há em mim
o poeta que há em mim
não é como o escrivão
que há em ti
funcionário
autárquico
o profeta que há em
mim
não é como a
cartomante que há em ti
cigana fulana
o panfleta que há em
mim
não é como o
jornalista que há em ti
matéria paga
o pateta que há em
mim
não é como o esteta
que há em ti
cana a la kant
o poeta que há em mim
é como o voo no homem
pressentido
Muitas faces
(Ernest Budu: artista
ganês)
Referência:
CHACAL. o poeta que
há em mim. In: HOLLANDA, Heloisa Buarque de (Org.). 26 poetas hoje:
antologia. 6. ed. Rio de Janeiro, RJ: Aeroplano Editora, 2007. p. 220.
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