Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

terça-feira, 6 de junho de 2023

Gottfried Benn - Não Pode Haver Tristeza

Este poema de Benn seria o seu último e, deliberadamente, posicionado na abertura do volume de seus “Poemas Coligidos”, publicados, de início em 1956, mesmo ano em que o poeta veio a falecer de uma neoplasia na coluna.

 

Ao empreender um rápido inventário dos leitos de morte de grandes homens ligados às letras – Droste-Hülshoff, Hölderlin, Rilke, Stefan George, Nietzsche –, o poeta, presumivelmente, tenciona invocar a ideia de que a morte atinge, de modo indiscriminado, figuras eminentes e anônimas do povo, não devendo ela nos fulminar com antecipada tristura.

 

Mesmo objetos de importância decisiva para as pessoas, com o tempo, tornam-se trastes, entrando em “decadência eterna”, deixando, ao fim, simplesmente de existir, quer hajam pertencido a pessoas famosas ou não: aos poetas resta o consolo e a expectativa de que suas obras possam perdurar incólumes à passagem do tempo!

 

J.A.R. – H.C.

 

Gottfried Benn

(1886-1956)

 

Kann Keine Trauer Sein

 

In jenem kleinen Bett, fast Kinderbett, starb die Droste

(zu sehn in ihrem Museum in Meersburg),

auf diesem Sofa Hölderlin im Turm bei einem Schreiner,

Rilke, George wohl in Schweizer Hospitalbetten,

in Weimar lagen die großen schwarzen Augen

Nietzsches auf einem weißen Kissen

bis zum letzten Blick −

alles Gerümpel jetzt oder garnicht mehr vorhanden,

unbestimmbar, wesenlos

im schmerzlos-ewigen Zerfall.

 

Wir tragen in uns Keime aller Götter,

das Gen des Todes und das Gen der Lust −

wer trennte sie: die Worte und die Dinge,

wer mischte sie: die Qualen und die Statt,

auf der sie enden, Holz mit Tränenbächen,

für kurze Stunden ein erbärmlich Heim.

 

Kann keine Trauer sein. Zu fern, zu weit,

zu unberührbar Bett und Tränen,

kein Nein, kein Ja,

Geburt und Körperschmerz und Glauben

ein Wallen, namenlos, ein Huschen,

ein Überirdisches, im Schlaf sich regend,

bewegte Bett und Tränen −

schlafe ein!

 

6. 1. 1956

 

A morte de Sêneca

(Manuel Domínguez Sánchez: pintor espanhol)

 

Não Pode Haver Tristeza

 

Naquela pequena cama, quase um leito infantil, Droste faleceu

(veja-se em seu museu de Meersburg),

Hölderlin, sobre um sofá na torre de um marceneiro,

Rilke e George, presumivelmente, em leitos hospitalares suíços,

Nietzsche, em Weimar, descansando os grandes olhos negros

sobre uma almofada branca

até o seu derradeiro olhar –

tudo agora traste ou já não ao absoluto dispor,

inatribuível, insubstancial,

em sua impassível e eterna decadência.

 

Trazemos dentro de nós as sementes de todos os deuses,

os genes da morte e do prazer –

quem os separou: as palavras e as coisas;

quem os misturou: os tormentos e o lugar

onde chegam ao fim, madeirame e torrentes de lágrimas,

um lar miserável por breves horas.

 

Não poder haver tristeza. Tão longe, tão distante,

direcionada a intangíveis lágrimas e leito,

nem não, nem sim,

nascimento e dor corporal e fé,

um ondular inominável, um disparar,

algo sobrenatural que se agita no sono,

movendo lágrimas e leito –

adormeça!

 

6. 1. 1956

 

Referência:

 

BENN, Gottfried. Kann keine trauer sein. In: __________. Gesammelte Werke: Bd. 3 - Gedichte. Herausgegeben von Dieter Wellershoff. 2. auflage. Berlin, DE: Limes Verlag, 1963. s. 5.

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