Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

terça-feira, 4 de abril de 2023

Pierre Jean Jouve - Lamentos ao cervo

Diante do conteúdo alegorizado dos versos deste poema, presumo que a figura do mencionado cervo ensanguentado, ao encalço do falante onde quer que se encontre, diga respeito ao Cristo reaparecido, sereno e ponderado, pondo em relevo os distintivos contrastantes de volúpia e de santidade, de sexualidade e de castidade.

 

A metáfora empregada – a de um cervo – bem se habilita a caracterizar tanto a virilidade quanto a morte, tanto o sacrifício, os desafios da vida, quanto a libertação – em suma, as faces contrárias da matéria e do espírito –, daí o nexo com a imagem de Cristo: o cervo, com efeito, acaba por configurar essa passagem por um ermo de um plano a outro, atravessando a morte e suplantando-a ao mesmo tempo.

 

J.A.R. – H.C.

 

Pierre Jean Jouve

(1887-1976)

 

Lamentations au cerf

 

Sanglant comme la nuit, admirable en effroi, et sensible

Sans bruit, tu meurs à notre approche.

Apparais sur le douloureux et le douteux

Si rapide impuissant de sperme et de sueur

Qu’ait été le chasseur; si coupable son

Ombre et si faible l’amour

Qu’il avait! Apparais dans un corps

Pelage vrai et

Chaud, toi qui passes la mort.

Oui toi dont les blessures

Marquent les trous de notre vrai amour

A force de nos coups, apparais et reviens

Malgré l’amour, malgré que

Crache la blessure.

 

Dans: “Sueur de Sang” (1933-1935)

 

Cervo morto

(Gustave Coubert: pintor francês)

 

Lamentos ao cervo

 

Ensanguentado como a noite, admirável no pavor, e dorido

Sem gemidos, morres quando nos aproximamos.

Apareces sobre o doloroso e o duvidoso,

Por mais apressado, impotente de esperma e de suor,

que haja sido o caçador; por mais que culpável a sua

Sombra e débil o amor

Que partilhava! Apareces em um corpo de

Pele genuína e

Quente, tu que atravessas a morte.

Sim, tu, cujas chagas

Assinalam as fendas de nosso genuíno amor,

À força de nossos golpes, apareces e regressas,

Apesar do amor, não obstante o quanto

Golfem as tuas chagas.

 

Em: “Suor de Sangue” (1933-1935)

 

Referência:

 

JOUVE, Pierre Jean. Lamentations au cerf. In: DÉCAUDIN, Michel (Éd.). Anthologie de la poésie française du XXe siècle. Préface de Claude Roy. Édition revue et augmentée. Paris, FR: Gallimard, 2000. p. 197-198.

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