Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sábado, 8 de abril de 2023

Cecília Meireles - Biografia

A poetisa dirige-se a um interlocutor que, segundo afirma, a despeito de tê-la escutado, ouvido ou visto o retrato, não a conhece de fato, pois que tais “fragmentos”, “instantes mínimos”, mal chegam a configurar uma “unidade”, haja vista que “fluímos entre circunstâncias”, daí porque somos “novos e antigos todos os dias”, ao arbítrio da forma como a “luz” nos alcança.

 

Nem “invenções sutis”, tampouco “teorias misteriosas”, seriam capazes de tornar presente a voz lírica, porque o contingente é parte inarredável de toda existência humana, uma autêntica “cascata de pedras”: há muito do que não se apreende nos repentes fortuitos, nos acidentais, que em cada um de nós sobejam, mediante esse transitivo jogo de “transparências e de opacidades”!

 

J.A.R. – H.C.

 

Cecília Meireles

(1901-1964)

 

Biografia

 

Escreverás meu nome com todas as letras,

com todas as datas,

e não serei eu.

 

Repetirás o que me ouviste,

o que leste de mim, e mostrarás meu retrato,

e nada disso serei eu.

 

Dirás coisas imaginárias,

invenções sutis, engenhosas teorias,

e continuarei ausente.

 

Somos uma difícil unidade,

de muitos instantes mínimos,

isso seria eu.

 

Mil fragmentos somos, em jogo misterioso,

aproximamo-nos e afastamo-nos, eternamente.

Como me poderão encontrar?

 

Novos e antigos todos os dias,

transparentes e opacos, segundo o giro da luz,

nós mesmos nos procuramos.

 

E por entre as circunstâncias fluímos,

leves e livres como a cascata pelas pedras.

– Que mortal nos poderia prender?

 

1957

 

Em: “Dispersos” (1918-1964)

 

Natureza efêmera

(Valorie Cross: pintora norte-americana)

 

Referência:

 

MEIRELES, Cecília. Biografia. In: __________. Poesia completa. 4. ed. Rio de Janeiro, RJ: Nova Aguilar, 1993. p. 1118-1119. (‘Biblioteca Luso-brasileira’: Série Brasileira)

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