Redigido ao estilo do
poeta português Fernando Pessoa (1888-1935), estes versos do escritor, tradutor
e também poeta carioca buscam apreender o que de enigmático e heteronômico há
no sujeito lírico, esse labirinto de imaginárias essências, réplicas de si mesmas,
autêntico signo caleidoscópico a partir do qual se projetam irrepetíveis
efígies do ser.
Ser que se revela por
identidade à profusão de sentimentos que lhe vão na alma, daí porque ilimitado,
a vagar numa nuvem contingente do espaço-tempo, a decantar-se numa profusão de
escritos que, por isso mesmo, não se prestam a desvendar-lhe exatamente o centro,
haja vista que pêndulo a perscrutar aleatoriamente os inúmeros polos desse ente
sibilino.
J.A.R. – H.C.
Paulo Henriques
Britto
(n. 1951)
Pessoana
Quando não sei o que
sinto
sei que o que sinto é
o que sou.
Só o que não meço não
minto.
Mas tão logo identifico
o não-lugar onde
estou
decido que ali não
fico,
pois onde me delimito
já não sou mais o que
sou
mas tão somente me
imito.
De ponto a ponto
rabisco
o mapa de onde não
vou,
ligando de risco em
risco
meus equívocos
favoritos,
até que tudo que sou
é um acúmulo de
escritos,
penetrável labirinto
em cujo centro não
estou
mas apenas me
pressinto
mero signo, simples
mito.
Quem sou eu?
(Alexander Moldavanov:
artista russo)
Referência:
BRITTO, Paulo
Henriques. Pessoana. In: SAVARY, Olga (Organização, seleção, notas e
apresentação). Antologia da nova poesia brasileira. Rio de Janeiro, RJ:
Fundação Rio / Hipocampo, 1992. p. 238.
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