É o cotidiano de um
solteirão que se vem a conhecer com estes versos: mal alimentado, tendo alucinações,
põe-se a redigir uma carta a um amigo que há muito faleceu. Chega mesmo a
reconhecer que precisa de uma companheira, mas logo se entretém com um filme na
televisão e, desse modo, a vida segue... e a carta fica à espera.
Rotina desregrada,
sem qualquer sentido de precedência em relação aos seus afazeres – ou isto ou
aquilo, tanto faz. Em determinado ponto, o falante hesita entre se masturbar ou
rezar, e, nesse ponto, ou bem faz rir os impudentes da hora ou bem infunde uma
carranca de censura no semblante dos mais puritanos.
J.A.R. – H.C.
Jaime Quezada
(n. 1942)
Solitario
Alguien toca los
vidrios de la ventana
Yo estoy desnudo
escribiendo una carta
A un amigo muerto
hace un montón de años
Me asomo a la ventana
y no hay nadie
Sólo un gato camina
por el muro vecino
Debe ser el viento
digo
Vuelvo a sentarme a
la máquina
Alguien ha borrado lo
que yo había escrito
Se nota claramente
que lo han borrado
Quién diablos ha
hecho esto
Abro el closet
Busco debajo de la
cama
Muevo la mesa
Debo estar viendo
visiones
Hace tres días que no
como
Empiezo de nuevo a
escribir la carta
Le cuento lo difícil
que está la vida
Que sería bueno
pensar en un viaje
Ahora mueven la
puerta
Alguien da golpes con
la aldaba
Pregunto que quién es
Nadie responde
Mi cuerpo se pone
carne de gallina
Disimulo tener valor
y abro la puerta
Adelante digo
bondadosamente
No entra nadie
Debo estar loco
Estoy perdiendo el
juicio
Me hace falta una
mujer
Haré pedazos esta
carta
Retiro el papel de la
máquina
Apago la luz
Dudo si masturbarme o
rezar
En ese momento me
acuerdo de una película en la T.V.
Enciendo el televisor
Mañana escribiré la
carta.
Homem visto de costas
(Tithi Luadthong:
artista tailandesa)
Solitário
Alguém toca as
vidraças da janela
Estou nu escrevendo
uma carta
A um amigo que morreu
há muitos anos
Olho pela janela e não
há ninguém
Apenas um gato
caminha pelo muro vizinho
‘Deve ser o vento’
digo
Volto a sentar-me diante
da máquina
Alguém apagou o que
eu havia escrito
Nota-se claramente que
o deletaram
Quem diabos fez isto
Abro o closet
Procuro embaixo da
cama
Arredo a mesa
Devo estar tendo
visões
Faz três dias que não
como
Começo de novo a
escrever a carta
Conto-lhe como a vida
está difícil
Que seria bom pensar
em uma viagem
Agora movem a porta
Alguém bate com a aldraba
Pergunto ‘quem é’
Ninguém responde
Meu corpo fica
arrepiado
Finjo ter coragem e
abro a porta
‘Adiante’ digo
gentilmente
Não entra ninguém
Devo estar louco
Estou perdendo o juízo
Faz-me falta uma
mulher
Rasgarei esta carta
em pedaços
Retiro o papel da
máquina
Apago a luz
Hesito entre masturbar-me
ou rezar
Nesse instante lembro-me
de um filme na TV
Ligo o televisor
Amanhã escreverei a
carta.
Referência:
QUEZADA, Jaime.
Solitario. In: COCO, Emilio (Comp.). Il fiore della poesia latinoamericana d’oggi.
Secondo volume – America meridionale – I. Edizione trilingue:
spagnolo/portoghese x italiano. Rimini, IT: Raffaelli Editore, ottobre 2016. p.
116 e 118. (‘Poesia Presente’; v. 6)
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