Alpes Literários

Alpes Literários

Subtítulo

UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quinta-feira, 29 de setembro de 2022

Jaime Quezada - Solitário

É o cotidiano de um solteirão que se vem a conhecer com estes versos: mal alimentado, tendo alucinações, põe-se a redigir uma carta a um amigo que há muito faleceu. Chega mesmo a reconhecer que precisa de uma companheira, mas logo se entretém com um filme na televisão e, desse modo, a vida segue... e a carta fica à espera.

 

Rotina desregrada, sem qualquer sentido de precedência em relação aos seus afazeres – ou isto ou aquilo, tanto faz. Em determinado ponto, o falante hesita entre se masturbar ou rezar, e, nesse ponto, ou bem faz rir os impudentes da hora ou bem infunde uma carranca de censura no semblante dos mais puritanos.

 

J.A.R. – H.C.

 

Jaime Quezada

(n. 1942)

 

Solitario

 

Alguien toca los vidrios de la ventana

Yo estoy desnudo escribiendo una carta

A un amigo muerto hace un montón de años

Me asomo a la ventana y no hay nadie

Sólo un gato camina por el muro vecino

Debe ser el viento digo

Vuelvo a sentarme a la máquina

Alguien ha borrado lo que yo había escrito

Se nota claramente que lo han borrado

Quién diablos ha hecho esto

Abro el closet

Busco debajo de la cama

Muevo la mesa

Debo estar viendo visiones

Hace tres días que no como

Empiezo de nuevo a escribir la carta

Le cuento lo difícil que está la vida

Que sería bueno pensar en un viaje

Ahora mueven la puerta

Alguien da golpes con la aldaba

Pregunto que quién es

Nadie responde

Mi cuerpo se pone carne de gallina

Disimulo tener valor y abro la puerta

Adelante digo bondadosamente

No entra nadie

Debo estar loco

Estoy perdiendo el juicio

Me hace falta una mujer

Haré pedazos esta carta

Retiro el papel de la máquina

Apago la luz

Dudo si masturbarme o rezar

En ese momento me acuerdo de una película en la T.V.

Enciendo el televisor

Mañana escribiré la carta.

 

Homem visto de costas

(Tithi Luadthong: artista tailandesa)

 

Solitário

 

Alguém toca as vidraças da janela

Estou nu escrevendo uma carta

A um amigo que morreu há muitos anos

Olho pela janela e não há ninguém

Apenas um gato caminha pelo muro vizinho

‘Deve ser o vento’ digo

Volto a sentar-me diante da máquina

Alguém apagou o que eu havia escrito

Nota-se claramente que o deletaram

Quem diabos fez isto

Abro o closet

Procuro embaixo da cama

Arredo a mesa

Devo estar tendo visões

Faz três dias que não como

Começo de novo a escrever a carta

Conto-lhe como a vida está difícil

Que seria bom pensar em uma viagem

Agora movem a porta

Alguém bate com a aldraba

Pergunto ‘quem é’

Ninguém responde

Meu corpo fica arrepiado

Finjo ter coragem e abro a porta

‘Adiante’ digo gentilmente

Não entra ninguém

Devo estar louco

Estou perdendo o juízo

Faz-me falta uma mulher

Rasgarei esta carta em pedaços

Retiro o papel da máquina

Apago a luz

Hesito entre masturbar-me ou rezar

Nesse instante lembro-me de um filme na TV

Ligo o televisor

Amanhã escreverei a carta.

 

Referência:

 

QUEZADA, Jaime. Solitario. In: COCO, Emilio (Comp.). Il fiore della poesia latinoamericana d’oggi. Secondo volume – America meridionale – I. Edizione trilingue: spagnolo/portoghese x italiano. Rimini, IT: Raffaelli Editore, ottobre 2016. p. 116 e 118. (‘Poesia Presente’; v. 6)

Nenhum comentário:

Postar um comentário