Assim como Langston
Hughes, poeta negro, cantou loas à América onde nascera (I, too, sing America),
Saba, poeta italiano de ascendência judaica, exaltou Trieste, sua cidade natal,
urbe com pouco mais de duzentos mil habitantes, mas que lhe parecia um recanto
propício, à medida para a sua vida meditativa e reclusa.
As metáforas
empregadas pelo poeta revelam uma cidade aberta, viva, expansiva, devotada ao
comércio por intermédio de seu porto, mas, ao mesmo tempo, um burgo reservado e
de taciturna graça, com um relevo demarcado por colinas e um ar qualificado
como tormentoso, estranho, nativo.
J.A.R. – H.C.
Umberto Saba
(1883-1957)
Trieste
Ho attraversata tutta
la città.
Poi ho salita un’erta
popolosa in
principio, in là deserta,
chiusa da un
muricciolo:
un cantuccio in cui solo
siedo; e mi pare che
dove esso termina
termini la città.
Trieste ha una
scontrosa
grazia. Se piace,
è come un ragazzaccio
aspro e vorace,
con gli occhi azzurri
e mani troppo grandi
per regalare un
fiore;
come un amore
con gelosia.
Da quest’erta ogni
chiesa, ogni sua via
scopro, se mena
all’ingombrata spiaggia,
o alla collina cui,
sulla sassosa
cima, una casa,
l’ultima, s’aggrappa.
Intorno
circola ad ogni cosa
un’aria strana,
un’aria tormentosa,
l’aria natia.
La mia città che in
ogni parte è viva,
ha il cantuccio a me
fatto, alla mia vita
pensosa e schiva.
In: “Trieste e una
donna” (1910-1912)
Trieste: rua da
catedral
(Anthony Meton: pintor
norte-americano)
Trieste
Atravessei toda a
cidade.
Depois subi uma
ladeira,
cheia de gente ao
princípio, no fim deserta,
fechada por uma
mureta:
um recanto onde
sozinho
me sento; e a mim
parece que onde ela termina,
termine a cidade.
Trieste tem uma graça
capciosa. Quando
agrada,
é como um garotão
áspero e voraz,
de olhos azuis e as
mãos grandes demais
para oferecer uma
flor;
como um amor
ciumento.
Daqui do alto
descubro cada igreja, cada rua
leve ela à praia
atulhada
ou à colina em cujo
cimo rochoso
uma casa, a última,
se aferra.
Em volta
de cada coisa circula
um ar estranho, um ar
tormentoso,
o ar nativo.
A minha cidade que
por toda parte é viva
tem o recanto feito
para mim, à medida de minha vida,
meditativa e reclusa.
Em: “Trieste e uma
mulher” (1910-1912)
Referência:
SABA, Umberto.
Trieste / Trieste. Tradução de Geraldo Holanda Cavalcanti. Revista
Brasileira. Academia Brasileira de Letras, Rio de Janeiro (RJ), fase VII, outubro-novembro-dezembro
2006, ano XIII, n. 49. Em italiano: p. 228; em português: p. 229. Disponível neste endereço. Acesso em: 12 set. 2022.
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