O poema fala de si
mesmo, dessa ingente necessidade de lutar contra a morte da palavra, extraindo-a
ao silêncio para fazer ressoar uma canção que deveras existe, mediante a
escrita e a impressão de versos para os quais tudo o mais congrega a variegada
matéria que compõe a vida – condição crucial, mas não suficiente para externar o
que seja a poesia propriamente dita.
Quantas vezes não se
sente que os versos talvez não representem toda a poesia que envolve o momento,
na mente do poeta ou da poetisa? Um pouco como naqueles versos de Drummond,
que, se não escritos, resultariam em silêncio insuspeitado para terceiros: “Gastei
uma hora pensando um verso que a pena não quer escrever. No entanto, ele está
cá dentro inquieto, vivo. Ele está cá dentro e não quer sair. Mas a poesia
deste momento inunda minha vida inteira”.
J.A.R. – H.C.
Vera Casa Nova
(n. 1944)
Para escrever um
poema
Para escrever um
poema
não basta um pássaro
ou uma flor:
basta o escrever
se é que basta:
esse pão
essa comida
esse vinho
do escrito
à impressão.
Fica um grito
entalado na garganta.
Tudo o que temos
não basta.
É preciso tirar da
morte
da palavra
esse silêncio
bastante
de si mesmo
e ouvir uma canção
inexistente.
Flores de Inspiração
(Olaf Hajek: artista
alemão)
Referência:
CASA NOVA, Vera. Para
escrever um poema. In: JARDIM, Rubens (Org.). As mulheres poetas na
literatura brasileira: antologia poética. Volume 1. São Paulo, SP: Edição
do Autor, 2018. p. 94.
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