Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quarta-feira, 14 de setembro de 2022

Rosa Ramos - Fazeres

Mais um poema a falar da elaboração, ou melhor, dos “fazeres” atrelados à criação do poema, desta feita de uma poetisa carioca: imagens, olores e melodias, associações com elementos da natureza, pensamentos, assombros – tudo se conjuga para gerar esse prodígio, essa lavra que nos subjuga com suas verdades irredutíveis, incomensuráveis a quaisquer outras.

 

O título do poema quase nos leva a associá-lo à labuta de um mestre-cuca ao produzir uma massa com ingredientes que muito bem se identificam quando previamente separados, mas que uma vez amalgamados, sovados à mão ou ao petrecho mesclados, tornam-se um gênero distinto, calibrado com predicados aptos a mobilizar desafiadoramente os nossos sentidos.

 

J.A.R. – H.C.

 

Rosane Ramos

(n. 1955)

 

Fazeres

 

o poeta chega sem alarde

ao branco da página;

invisível quase,

pensa a melodia

que há em cada frase

e conjuga verbo e imagem,

tudo em pensamento,

que não se atreve

a acelerar o tempo

do poema imberbe.

cheira a folha,

rege o vento que a sopra

espanta a mariposa-

palavra que vem surgindo

como lua clara.

talvez um tango,

talvez espanto, ele pensa,

as rimas passarinhando seu cérebro,

uns grunhidos de fonemas

avançam sobre ele

até que exausto rende-se

ao eterno exílio

da palavra extrema.

 

O anjo de pé ao sol

(William Turner: artista inglês)

 

Referência:

 

RAMOS, Rosa. Fazeres. In: JARDIM, Rubens (Org.). As mulheres poetas na literatura brasileira: antologia poética. Volume 2. São Paulo, SP: Edição do Autor, 2018. p. 27.

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