Este poema foi
escrito pela poetisa, feminista e ativista peruana quando de sua estadia em
Buenos Aires (AR), lá pelos inícios da década dos 50 do século passado: perante
um domingo que amanheceu chuvoso, Portal contempla a capital argentina,
parece-me, menos com um olhar neutral do que por uma perspectiva privada,
subjetiva, talvez enredada na mesma solidão que vê profusamente a pairar sobre
a cidade.
Dúvidas sobre o tempo
são suscitadas, idem as possibilidades de afazeres para “um domingo qualquer”,
mas nada que lhe traga ao espírito o ânimo ardente dos cidadãos portenhos.
Antes: raros os versos nos quais se abordam potenciais contatos humanos. A
cidade, como a muitos, parece-lhe um sítio de pedra onde se dissemina a
indiferença e o insulamento.
J.A.R. – H.C.
Magda Portal
(1900-1989)
Un domingo cualquiera
Hoy es domingo aqui en Buenos Aires
amaneció lloviendo
lento caer del agua
sucia de hollín de tierra
sobre las veredas
sobre el asfalto o el
adoquinado
Domingo un domingo cualquiera
¿también será domingo
en otras partes?
¿habrá lluvia o habrá
sol?
¿barnizará la tierra
su silencio
de chimeneas
humeantes
de casas grises de
gestos sin elocuencia?
¿Caerá la lluvia
detrás de los cristales
royendo el hierro o
el cemento?
¿Habrá risas y gritos
de muchachos
corno campanas de
luz?
Habrá las avenidas
del recuerdo
los caminos de tierra con hierba humedecida
y los perros de ojos
lacrimosos
que dan ganas de
decirles “hermano”
Pero aquí en Buenos
Aires no hay ni eso
Domingo con cinema
con paseos con olor a
mar aunque haga frío
¡La pequeña ciudad sin
artificios!
Aquí la soledad
puebla todos los ecos
los rebalsa con su
agua salobre
aquí el atardecer no
pinta incendios
el sol no alcanza a
trepar los rascacielos
y la línea lejana del
crepúsculo
se hunde en el río
inmenso
Los árboles
prisioneros
uniformados por el
humo
no templan la
guitarra de los pájaros
Hay un grito sin voz
que rasga el tiempo
y que se pierde sin
destino
Hay un deseo atroz
de amurallarse el
alma
en el gran sueño
[Buenos Aires, 1950]
En: “Constancia del
ser” (1965)
Domingo no Parque
(Cyprien-Eugène
Boulet: pintor francês)
Um domingo qualquer
Hoje é domingo
aqui em Buenos Aires
amanheceu chovendo
lento cair de água com
laivos de fuligem de terra
sobre as calçadas
sobre o asfalto ou os
paralelepípedos
Domingo um domingo qualquer
também será domingo
noutros lugares?
haverá chuva ou haverá
sol?
envernizará a terra o
seu silêncio
de fumegantes
chaminés
de casas cinzentas de
gestos sem eloquência?
Cairá a chuva por
trás das vidraças
corroendo o ferro e o
cimento?
Haverá risos e gritos
de crianças
como sinos de luz?
Haverá as avenidas da
memória
os caminhos de
terra com grama molhada
e os cães de olhos
lacrimosos
que dão vontade de
dizer-lhes “irmãos”
Mas aqui em Buenos
Aires nem isso há
Domingo com cinema
com passeios, com os
eflúvios do mar
ainda que faça frio
A pequena cidade sem
artifícios!
Aqui a solidão povoa
todos os ecos
transborda-os com a
sua água salobra
aqui o entardecer não
pinta incêndios
o sol não chega a
escalar os arranha-céus
e a linha distante do
crepúsculo
imerge no rio imenso
As árvores cativas
uniformizadas pela
fumaça
não dão o tom ao
violão dos pássaros
Há um grito sem voz
que rasga o tempo
e que se perde sem
destino
Há um desejo atroz
de se enclausurar a
alma
no sono infinito
[Buenos Aires, 1950]
En: “Constância do
ser” (1965)
Referência:
PORTAL, Magda. Un
domingo cualquiera. In: __________. Obra poética completa. Edición,
prólogo, notas y cronología de Daniel R. Reedy. Lima, PE: Fondo de Cultura
Económica, 2010. p. 275-276. (Colección ‘Tierra Firme’)
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