Uma parede em
situação não estável, delimitando um banheiro numa presumível suíte ou o quer
que fosse, consistia no plano de reforma levado a efeito pelo ente lírico em
sua residência: contratou pedreiros para torná-la uma firme baliza entre os
precitados recintos – ou melhor, pelo menos esse fora o objetivo imediato.
Mas as coisas não
andaram conforme o esperado e a parede reergueu-se num pernoite, em meio ao
qual os residentes, sonolentos, nela esbarraram e se aperceberam de que se
tratava da mesma velha parede. E mais: deram com uma inesperada nota de “suicídio”
em rabiscos na taipa, com o sangue ainda fresco. Resultado: dispensa, mediante
paga, dos profissionais e um aprendizado para toda a vida sobre projetos de reforma.
Seria a casa “mal-assombrada”,
digna dos melhores contos de terror e de imaginação saídos da pena de Allan
Poe? Foram os fantasmas que reergueram a parede durante a noite? Ou teria sido
a alma penada do suicida, ainda não desgarrada de suas experiências terrenas? Sabe-se
lá: cenas para os próximos capítulos...
J.A.R. – H.C.
Jerry Pinto
(n. 1966)
House Repairs
All it took was the
flick of a chisel
And the bathroom wall
came sighing down.
It wasn’t quite what
we had hoped for
But we took it for
what it was:
One more act
In a prolonged
dramaturgy
Of cement.
The new wall came up quickly.
Overnight, it was
back in place.
It was all that a new
wall should be
Or so we hoped.
Only, the next
morning and the next
When, sleep-clogged,
we lurched into it
We found it was our
old wall.
With a suicide note
still scrawled on it
The blood still fresh
on it.
We paid the masons
anyway
And learned something
about renovation.
Kentucky rural
(Mark Downey: pintor
norte-americano)
Reparos em Casa
Bastou um golpe de
cinzel para que
A parede do banheiro
viesse abaixo.
Não era exatamente o
que esperávamos,
Mas tomamo-lo pelo
que era:
Um ato a mais
Numa prolongada
dramaturgia
De cimento.
Ergueu-se a nova
parede com rapidez.
Da noite para o dia,
estava de volta ao seu lugar.
Era tudo o que uma
nova parede deveria ser
Ou o que fosse de
nosso aguardo.
Somente na manhã
seguinte e na próxima,
Quando, aturdidos
pelo sono, cambaleamos contra ela,
Descobrimos que se
tratava da nossa velha parede.
Até agora há uma nota
de suicídio nela rabiscada
Com o sangue ainda fresco.
De todo modo, demos quitação
aos pedreiros
E aprendemos algo
sobre reformas.
Referência:
PINTO, Jerry. House
repairs. In: THAYIL, Jeet (Ed.). 60 indian poets. New Delhi, IN: Penguin
Books India, 2008. p. 322.
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