Hoje, data em que,
aqui pelo Brasil, se comemora o Dia do Gato, posto um poema que nos narra as
aventuras do bichano pela História, passando pelas mais distintas civilizações –
a exemplo da do Egito, da Grécia, de Roma e de outros países ao redor do
Mediterrâneo –, sem esquecer dos infortúnios a que foi exposto pela prática da
bruxaria, como no caso dos felinos negros, lá pelas centúrias da Idade Média, conjuntura
que, em última instância, motivou a edição da “Bula Summis” pelo Papa Inocêncio
VIII.
Sob um título em espanhol
claramente escolhido para fazer alusão ao felino – menos por seu sentido do que
por parte de seu significante –, a escritora madrilena não olvida em consignar
o fato de que grandes escritores, como Poe, Baudelaire e Borges (aqui pelo
Brasil, mencionaria Guimarães Rosa), deixaram-se muito fascinar pelas maneiras
esfíngicas e independentes dessa espécie animal.
J.A.R. – H.C.
Milagros Salvador
(n. 1949)
Alegato
Mediterráneo,
dioses, del mar donde
nacieron
tan unidos al alma de
los hombres,
por las ondas del
tiempo
te traigo hasta mis
días.
Apareciste con ojos
insondables,
pupilas que ocultaban
el secreto del Nilo,
del templo a los
salones de palacio
llegaste a Grecia y
Roma,
con un residuo fiero
que escondes en las patas,
caricia consentida
con un pacto no escrito,
sin renunciar jamás
al propio espacio
en el que guardas la
memoria.
La sombra cubrió
durante siglos
la razón de los
hombres,
incienso perturbado,
gato negro
al lado de las
brujas,
bajo la llama
hiriente de la hoguera
se cubrieron los
sueños de ceniza,
Bula Summis, la letra
más sagrada
del octavo Inocencio
de no inocente nombre,
condena innecesaria,
invocación suprema a
la tortura,
largo camino sin
excusas
hasta encontrar las
luces de otro siglo.
Y tú sobreviviste al
juicio de la Historia,
lo mismo que los
símbolos,
Renacimiento, poco a
poco,
apareciste en las
pinturas,
(Giulio Romano y su
Madonna)
y en el Romanticismo
al lado de la lírica.
Hoy andas por la
casa,
entre las soledades
de algún escritor cómplice,
Baudelaire, cerca del
corazón,
Edgar A. Poe, la
sombra,
Borges, Walter Scott
y Chateaubriand en el mistério,
Lorca, luz en los
arrabales,
y con Cocteau frente
a la chimenea,
Colette y Bernard
Shaw cerca de su escritorio,
otros muchos te
fueron dando nombre,
y hoy yo también,
amigo.
O almoço do gato
(Marguerite Gérard:
pintora francesa)
Arrazoado
Mediterrâneo,
deuses, do mar onde
nasceram
tão unidos à alma dos
homens,
pelas ondas do tempo
trago-te até os meus
dias.
Apareceste com olhos
insondáveis,
pupilas que ocultavam
o segredo do Nilo,
do templo aos salões
de palácio
chegaste até a Grécia
e a Roma,
com um resíduo feroz
que escondes nas patas,
carícia consentida
com um pacto não escrito,
sem jamais renunciar
ao próprio espaço
no qual guardas a
memória.
A sombra cobriu
durante séculos
a razão dos homens,
incenso perturbado,
gato negro
ao lado das bruxas,
sob a chama
lancinante da fogueira
os sonhos
converteram-se em cinzas,
Bula Summis, a carta mais
sagrada
do oitavo Inocêncio
de não inocente nome,
condenação
desnecessária,
suprema invocação à tortura,
longo caminho sem
escusas
até encontrar as
luzes de outro século.
E sobreviveste ao
julgamento da História,
assim como os
símbolos,
Renascença, pouco a
pouco,
apareceste nas
pinturas,
(Giulio Romano e sua
Madonna)
e no Romantismo ao
lado da lírica.
Hoje andas pela casa,
entre as solidões de
algum escritor cúmplice,
Baudelaire, perto do
coração,
Edgar A. Poe, a
sombra,
Borges, Walter Scott
e Chateaubriand no mistério,
Lorca, luz nos arrabaldes,
e com Cocteau frente
à lareira,
Colette e Bernard
Shaw junto à escrivaninha,
muitos outros honraram
o teu nome,
e hoje eu também,
amigo.
Referência:
MILAGROS, Salvador. Alegato. In: __________. Gira nocturna. Madrid, ES: Editorial Verbum, 2005. p. 20-21.
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