A par da gradação às
avessas que o poeta empreende do “ruim” ao “muito ruim” e, daí, ao superlativo “pior”,
nota-se no poema certo tom sequioso, até nostálgico, em relação aos regalos que
acaba por inventariar à realidade – um romance policial inglês, uma cerveja
gelada, a poesia, o mar, uma xícara de café e, por fim, um tranquilo fenecer.
Há na terceira
estrofe um tributo indireto a outro grande poeta e filósofo alemão – Friedrich
Hölderlin (1770-1843) – e uma paralela percussão aos professores da área, de
quem capturara os seus artifícios lucubratórios: reconhecer o que não é conforme
ao que é melhor também nos permite aquilatar os prazeres simples que dão suporte
ao colorido do quotidiano, arrancando-nos ao tédio molesto.
J.A.R. – H.C.
Gottfried Benn
(1886-1956)
Was schlimm ist
Wenn man kein
Englisch kann,
von einem guten
englischen
Kriminalroman zu
hören,
der nicht ins
Deutsche übersetzt ist.
Bei Hitze ein Bier
sehn,
das man nicht
bezahlen kann.
Einen neuen Gedanken
haben,
den man nicht in
einen Hölderlinvers
einwickeln kann,
wie es die
Professoren tun.
Nachts auf Reisen
Wellen schlagen hören
und sich sagen, daß
sie das immer tun.
Sehr schlimm: eingeladen
sein,
wenn zu Hause die
Räume stiller,
der Café besser
und keine
Unterhaltung nötig ist.
Am schlimmsten:
nicht im Sommer
sterben,
wenn alles hell ist
und die Erde für
Spaten leicht.
Monge à beira-mar
(Caspar David
Friedrich: pintor alemão)
Mau
Quando não se sabe
inglês algum,
ouvir falar de um bom
romance policial inglês
que não está
traduzido em alemão.
No calor, ver uma
cerveja
que não se pode
pagar.
Ter uma ideia nova
que não se pode
embrulhar num verso
de Hölderlin
como os professores
fazem.
Viajando à noite,
ouvir as ondas baterem
e dizer consigo que
elas sempre fazem isso.
Muito mau: ser
convidado,
quando em casa os
espaços são mais tranquilos,
o café melhor
e nenhuma conversa é
necessária.
O pior de tudo:
morrer sem que seja
verão,
quando tudo está
claro
e a terra leve para a
pá.
Referência:
BENN, Gottfried. Mau.
Tradução de Mario Luiz Frungillo. In: PAES, José Paulo (Organização, Nota
Liminar e Posfácio). Transverso: coletânea de poemas traduzidos. Edição
bilíngue. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 1988. Em alemão: p. 64; em
português: p. 65. (Coleção ‘Viagens da Voz’)
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