Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

segunda-feira, 13 de janeiro de 2020

Eugenio Montale - Chia a roldana dentro da cisterna

De uma reminiscência qualquer, Montale procura resgatar um momento de felicidade, fugaz que seja, em que um rosto em plena primavera ri-se da face agora marcada pela maturidade, da qual logo se afasta pelo efeito evanescente da roldana do pensamento, capaz de a tudo engolfar no poço da memória.

Mas o outro a que alude os versos do poema é o mesmo ente lírico do qual a imagem resgatada diz respeito, apenas diferençada pelas muitas águas que passaram por baixo da ponte. Ou de outra forma: trata-se da heraclitiana máxima de que nada é permanente, senão a mudança!

J.A.R. – H.C.

Eugene Montale
(1896-1981)

Cigola la carrucola del pozzo

Cigola la carrucola del pozzo,
l’acqua sale alla luce e vi si fonde.
Trema un recordo nel ricolmo secchio,
nel puro cerchio un’immagine ride.
Accosto il volto a evanescenti labbri:
si deforma il passato, si fa vecchio,
appartiene ad un altro...
Ah che già stride
la ruota, ti ridona all’atro fondo,
visione, una distanza ci divide.

O Poço
(Guillaume Seignac: pintor francês)

Chia a roldana dentro da cisterna

Chia a roldana dentro da cisterna,
a água sobe à luz e nela se funde.
Uma lembrança freme em balde cheio,
no puro círculo ri-se uma imagem.
Encosto o rosto a evanescentes lábios:
deforma-se o passado, faz-se velho,
pertence a um outro...
Ah que já range
a roda, devolve-te ao negro fundo,
visão, uma distância nos separa.

Referência:

MONTALE, Eugenio. Cigola la carrucola del pozzo / Chia a roldana dentro da cisterna. Tradução de Renato Xavier. In: __________. Ossos de sépia: 1920-1927. Tradução, prefácio e notas de Renato Xavier. São Paulo, SP: Companhia das Letras, 2011. Em italiano: p. 100; em português: p. 101. (Edição comemorativa dos 25 anos da Companhia das Letras)

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