Eis o tema da criatividade exposto pelo ente lírico mediante uma
lembrança dos anos em que teve de se decidir sobre um desempenho de estreia: o
poeta, enquanto artesão da palavra, cotejado a um artista neófito que adentra o
palco pela primeira vez, como se um ator fosse, mas ainda sob a influência de
pensamentos imaturos acerca da essência do teatro (ou, de outro lado, da arte
poética).
Mas não nos enganemos: o futuro é o principal assunto da reflexão de
Pasternak. E já agora o artista se encontra numa autêntica arena de abate, assim
como no Coliseu de Roma (e se não houver a plateia a exigir sua morte!). Moral
do enredo: não há complacência no poeta capaz de criar uma poesia de qualidade,
pois o vate se torna um escravo apto a morrer pela verdade!
J.A.R. – H.C.
Boris Pasternak
(1890-1960)
О, знал бы я, что так бывает...
О, знал бы я, что так бывает,
Когда пускался на дебют,
Что строчки с кровью — убивают,
Нахлынут горлом и убьют!
От шуток с этой подоплёкой
Я б отказался наотрез.
Начало было так далёко,
Так робок первый интерес.
Но старость – это Рим, который
Взамен турусов и колёс
Не читки требует с актёра,
А полной гибели всерьёз.
Когда строку диктует чувство,
Оно на сцену шлёт раба,
И тут кончается искусство,
И дышат почва и судьба.
(1932)
Interior do Coliseu de Roma
(Cole Thomas: pintor
angloamericano)
Poema
Ah, se eu antes
soubera desta sina,
Quando me preparava
para a estreia,
Que há morte nestas
linhas, – assassinas!
Como um golpe de
sangue na traqueia.
Os folguedos desta
busca de avessos
Eu deixaria, inúteis,
de uma vez.
Já tão remoto o
esforço do começo,
Tão temeroso o
primeiro interesse.
Mas a velhice é Roma.
Não lhe peça
Que venha com
estórias de ninar.
Ela exige do ator
mais que uma peça,
Uma entrega total, um
naufragar.
Quando o verso é um
ditado do mais íntimo,
Ele imola um escravo
em cena aberta.
E aqui termina a
arte, o pano fecha,
Ao respirar da terra
e do destino.
(Folhetim, 09.05.82)
Referências:
Em Russo
Em Português
PASTERNAK, Boris. Poema. Tradução de
Boris Schnaiderman e Haroldo de Campos. In: SUZUKI JR., Matinas; ASCHER, Nelson
(Organizadores). Folhetim: poemas
traduzidos. São Paulo, SP: Folha de São Paulo, 1987. p. 190.
❁
Nenhum comentário:
Postar um comentário