Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

terça-feira, 12 de novembro de 2019

Pablo Neruda - A calar-se

Segundo Neruda, há certa tristeza em manter-se em movimento contínuo, na lida da vida, sem qualquer tempo para contemplar o mais íntimo de si mesmo e a natureza em seus ciclos. Isto porque, nessa azáfama, há outras tantas formas de agressão mútua, quer pela incitação à guerra quer pelos desentendimentos que, se não nos fazem morrer, de todo modo nos levam a estados de desgostos latentes.

Mesmo a natureza tem os seus estados de inação, a exemplo das temporadas invernais, em que tudo pode até parecer morto, mas, no fundo, apenas recolhido à inatividade por algumas semanas, tempo suficiente de descanso para que, logo à frente, a terra novamente fique a resplender com a beleza das flores. Com efeito, algum silêncio é necessário para que as cordas possam percutir uma nova canção de primavera!

J.A.R. – H.C.

Pablo Neruda
(1904-1973)

A callarse

Ahora contaremos doce
y nos quedamos todos quietos.

Por una vez sobre la tierra
no hablemos en ningún idioma,
por un segundo detengámonos,
no movamos tanto los brazos.

Sería un minuto fragante,
sin prisa, sin locomotoras,
todos estaríamos juntos
en una inquietud instantánea.

Los pescadores del mar frío
no harían daño a las ballenas
y el trabajador de la sal
miraría sus manos rotas.

Los que preparan guerras verdes,
guerras de gas, guerras de fuego,
victorias sin sobrevivientes,
se pondrían un traje puro
y andarían con sus hermanos
por la sombra, sin hacer nada.

No se confunda lo que quiero
con la inacción definitiva:
la vida es solo lo que se hace,
no quiero nada con la muerte.

Si no pudimos ser unánimes
moviendo tanto nuestras vidas,
tal vez no hacer nada una vez,
tal vez un gran silencio pueda
interrumpir esta tristeza,
este no entendernos jamás
y amenazarnos con la muerte,
tal vez la tierra nos enseñe
cuando todo parece muerto
y luego todo estaba vivo.

Ahora contaré hasta doce
y tú te callas y me voy.

Caminhando à beira-mar: Grado (Itália)
(Barbara Philip: pintora zimbabuana)

A calar-se

Agora contaremos até doze
e todos ficaremos quietos.

Por uma vez sobre a terra
não falemos em nenhum idioma,
por um segundo detenhamo-nos,
não movamos tanto os braços.

Seria um minuto fragrante,
sem pressa, sem locomotivas,
todos estaríamos juntos
em uma instantânea inquietude.

Os pescadores do mar frio
não machucariam as baleias
e o trabalhador que recolhe o sal
poria os olhos em suas mãos cansadas.

Os que preparam guerras verdes,
guerras com gás, guerras com fogo,
vitórias sem sobreviventes,
vestiriam um traje puro
e andariam com seus irmãos
pela sombra, sem nada fazer.

Não se confunda o que quero
com a inação definitiva:
a vida é só o que se faz,
não quero nada com a morte.

Se não fôssemos tão unânimes
em manter nossas vidas em movimento,
talvez não fazer nada uma vez,
talvez um grande silêncio possa
interromper esta tristeza
de jamais nos entendermos
e nos ameaçarmos com a morte,
talvez a terra nos ensine
como quando tudo parece morto
e depois revela estar vivo.

Agora contarei até doze
e tu te calas e eu me vou.

Referência:

NERUDA, Pablo. A callarse / A calar-se. In: __________. Extravagaria. A bilingual edition: spanish x english. Translated by Alastair Reid. London, EN: Jonathan Cape Thirty Bedford Square, 1972. p. 26 e 28.

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