Segundo Neruda, há certa tristeza em manter-se em movimento contínuo, na
lida da vida, sem qualquer tempo para contemplar o mais íntimo de si mesmo e a
natureza em seus ciclos. Isto porque, nessa azáfama, há outras tantas formas de
agressão mútua, quer pela incitação à guerra quer pelos desentendimentos que,
se não nos fazem morrer, de todo modo nos levam a estados de desgostos latentes.
Mesmo a natureza tem os seus estados de inação, a exemplo das temporadas
invernais, em que tudo pode até parecer morto, mas, no fundo, apenas recolhido
à inatividade por algumas semanas, tempo suficiente de descanso para que, logo
à frente, a terra novamente fique a resplender com a beleza das flores. Com
efeito, algum silêncio é necessário para que as cordas possam percutir uma nova
canção de primavera!
J.A.R. – H.C.
Pablo Neruda
(1904-1973)
A callarse
Ahora contaremos doce
y nos quedamos todos
quietos.
Por una vez sobre la
tierra
no hablemos en ningún
idioma,
por un segundo detengámonos,
no movamos tanto los
brazos.
Sería un minuto
fragante,
sin prisa, sin
locomotoras,
todos estaríamos
juntos
en una inquietud
instantánea.
Los pescadores del
mar frío
no harían daño a las
ballenas
y el trabajador de la
sal
miraría sus manos
rotas.
Los que preparan
guerras verdes,
guerras de gas,
guerras de fuego,
victorias sin
sobrevivientes,
se pondrían un traje
puro
y andarían con sus
hermanos
por la sombra, sin
hacer nada.
No se confunda lo que
quiero
con la inacción
definitiva:
la vida es solo lo
que se hace,
no quiero nada con la
muerte.
Si no pudimos ser unánimes
moviendo tanto
nuestras vidas,
tal vez no hacer nada
una vez,
tal vez un gran
silencio pueda
interrumpir esta
tristeza,
este no entendernos
jamás
y amenazarnos con la
muerte,
tal vez la tierra nos
enseñe
cuando todo parece
muerto
y luego todo estaba
vivo.
Ahora contaré hasta doce
y tú te callas y me
voy.
Caminhando à beira-mar: Grado (Itália)
(Barbara Philip:
pintora zimbabuana)
A calar-se
Agora contaremos até
doze
e todos ficaremos
quietos.
Por uma vez sobre a
terra
não falemos em nenhum
idioma,
por um segundo detenhamo-nos,
não movamos tanto os
braços.
Seria um minuto fragrante,
sem pressa, sem
locomotivas,
todos estaríamos
juntos
em uma instantânea inquietude.
Os pescadores do mar
frio
não machucariam as
baleias
e o trabalhador que
recolhe o sal
poria os olhos em
suas mãos cansadas.
Os que preparam
guerras verdes,
guerras com gás, guerras
com fogo,
vitórias sem
sobreviventes,
vestiriam um traje
puro
e andariam com seus
irmãos
pela sombra, sem nada
fazer.
Não se confunda o que
quero
com a inação
definitiva:
a vida é só o que se
faz,
não quero nada com a
morte.
Se não fôssemos tão
unânimes
em manter nossas
vidas em movimento,
talvez não fazer nada
uma vez,
talvez um grande
silêncio possa
interromper esta
tristeza
de jamais nos entendermos
e nos ameaçarmos com
a morte,
talvez a terra nos
ensine
como quando tudo
parece morto
e depois revela estar
vivo.
Agora contarei até
doze
e tu te calas e eu me
vou.
Referência:
NERUDA, Pablo. A callarse / A calar-se.
In: __________. Extravagaria. A
bilingual edition: spanish x english. Translated by Alastair Reid. London, EN: Jonathan
Cape Thirty Bedford Square, 1972. p. 26 e 28.
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