As palavras têm poder? Pelo que se pode deduzir das Escrituras,
certamente, pois foi com a autoridade do verbo que os dias se sucederam na
criação do mundo, quando então céus e terra passaram a existir, a partir do
engenho divino: a persuasiva dicção por trás do ‘big bang’ teorizado pelos
cientistas.
Mas as palavras ganham – paradoxalmente – ainda maior concretude nos
meandros da poesia – significante, som e significado para expressarem todo um
universo simbólico que habita a mente humana, a buscar equivalência ou mais
beleza do que aquilo que, à sua volta, tenciona representar.
J.A.R. – H.C.
Foed Castro Chamma
(1927-2010)
O Poder da Palavra
Articular o verbo até
medir-lhe o som,
a extensão de suas
cordas, suas arestas,
as potências contidas
no ritmo
interior
o colorido,
seu poder de fuga
e apreensão, seu fogo
e ouro, sua hora
inflamada,
as vibrações diluídas
nos dentes,
sua fluida aparência
de poliedro
disfarçado,
sua aritmética de
pedra
e explosão,
seu trânsito na
escala rarefeita
da audiência à voz
que o emite,
condensando-o em
cargas – símbolos
lançados – dardo
O verbo:
Ar ao touro
não a flor para a sua
fúria
barbante atando os
gestos
barro entre pedreiro
e muro
liberto
como um risco
no corpo, como um
risco
de faca, como um
risco
de bala, como um
risco
de espelho, como um
risco
de ouro
que se queima nas
folhas
rubras do fogo
se consome nas dobras
sujas da mente, não
crepita
nem freme, sim
acende o grito
da fome
Fogo e Ouro
corcel violento com
jatos
de cor
sua meta, a linha
do ar
seu pasto
Em: “O Poder da Palavra” (1959)
Fogueira
(Bob Ross: pintor
norte-americano)
Referência:
CHAMMA, Foed Castro. O poder da
palavra. In: SEFFRIN, André (Seleção e Prefácio). Roteiro da poesia brasileira: anos 50. 1. ed. São Paulo, SP:
Global, 2007. p. 64-65.
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