Apesar de relativamente breve, este poema de Figueroa evidencia o que de
mais sublime há na gnose da natureza, a providenciar que tudo aconteça no momento
oportuno – os ipês a florescer sempre numa época do ano, as mangueiras
abarrotadas de frutos e, no caso avocado, as cigarras a anunciarem o verão.
E o anúncio, como se sabe, é aquele ressonante canto dos machos,
estridulante e perturbador: afinal, as cigarras afloram da terra para
acasalarem-se exatamente no período mais quente no ano. E a quem atravessa o
terreno onde elas se fixam em troncos de árvores só resta o apelo de tentar
tapar os ouvidos ao fragor.
J.A.R. – H.C.
Luis Beltrán P. Figueroa
(1902-1993)
Decreto de Cigarras
Se partió la tarde
con el largo cuchillo
de un grito de
cigarra.
Por la cortada luz
pasa una gota de
silencio
que escapó de la
estridencia,
com pálpito de susto,
tapados los oídos
fue en busca de un
refugio.
Las cigarras
en la mitad del día
derogaron el
silencio:
habían decretado el verano.
(1978)
Celebração da Cigarra
(Lynn Young: pintora
norte-americana)
Decreto das Cigarras
Partiu-se a tarde
com a lâmina longa
de um grito de
cigarra.
Na luz cortada
escorre uma gota de
silêncio
escapado à
estridência,
palpitar de susto,
os ouvidos tapados
em busca de refúgio.
As cigarras
no meio do dia
derrogaram o
silêncio:
tinham decretado o
verão.
(1978)
Referência:
FIGUEROA, Luis Beltrán Prieto. Decreto
de cigarras / Decreto das cigarras. Tradução de José Santiago Naud. In:
__________. Verba minima. Tradução
de José Santiago Naud. Caracas, VE: Anauco Ediciones, 2005. Em espanhol: p. 28;
em português: p. 29.
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