Yeats vai de encontro à ideia de que a beleza passa como um sonho, pois
esta também faz interface com grandes enredos da violência humana, tais como os
imortalizados nos desenlaces do saque de Troia ou na morte dos filhos de Usna. Por
conseguinte, a beleza de sua amada, a atriz e feminista irlandesa Maud Gonne,
teria, do mesmo modo, potencial para inspirar voragens de destruição.
O poeta até sugere que os entes imortais, como os arcanjos, persignem-se
frente à inalterável beleza de Gonne, pois lhe parece que ela sempre existiu,
ao lado de Deus, antes de começar este mundo, mundo esse, aliás, que teria sido
concebido, antes de tudo, para que ela o pudesse altaneiramente trilhar.
J.A.R. – H.C.
W. B. Yeats
(1865-1939)
The Rose of the World
Who dreamed that
beauty passes like a dream?
For these red lips,
with all their mournful pride,
Mournful that no new
wonder may betide,
Troy passed away in
one high funeral gleam,
And Usna’s children
died.
We and the labouring
world are passing by:
Amid men’s souls,
that waver and give place
Like the pale waters
in their wintry race,
Under the passing
stars, foam of the sky,
Lives on this lonely
face.
Bow down, archangels,
in your dim abode:
Before you were, or
any hearts to beat,
Weary and kind one
lingered by His seat;
He made the world to
be a grassy road
Before her wandering
feet.
O duplo secreto
(René Magritte:
artista belga)
A Rosa do Mundo (1)
Quem sonhou que a
beleza passa como um sonho?
Por esses lábios
rubros, de orgulho tristonho
Por um assombro novo
não acontecer,
Troia passou, alto
vislumbre funeral,
E os filhos de Usna
vieram a morrer. (2)
Nós e o mundo que
lida estamos a passar:
Entre almas de
homens, que oscilando dão lugar
Como as pálidas águas
na invernal corrida,
Sob estrelas em fuga,
espuma celestial.
Esta face sozinha
leva a sua vida.
Inclinai-vos,
arcanjos, na turva morada:
Antes que fôsseis, ou
pulsasse um coração, já antes,
Ela era ao pé do
Trono, amável e cansada;
Fez Ele o mundo para
ser relvosa a estrada
Ante seus pés
errantes.
Notas do Tradutor:
(1). Neste poema, de The Rose (1893), Yeats compara a
bem-amada (Maud Gonne) a Helena de Troia e a Deirdre. A mulher – frisa Ellmann,
logo se torna a própria beleza ante o trono de Deus, “concepção familiar a
Shelley e Spenser, e que deve à teoria cabalística e neoplatônica de que a Shekhinah ou eterno feminino é coevo de
Deus”.
(2) “Os filhos de Usna: Naisi, que
amava Deirdre, a qual devia casar com o rei Conchubar, e os irmãos do moço,
Ardan e Anly. Os três morreram por ela. Deirdre era moça de extrema formosura.
Nota de Alerta:
Péricles Eugênio da Silva Ramos
emprega, na introdução e em muitas de suas traduções, referências à obra abaixo,
a exemplo da menção contida na Nota 1 supra.
ELLMANN, Richard. The identity of Yeats. 3rd. ed. London, EN: Faber and Faber, 1983.
Quanto aos personagens citados na Nota
2, pertencem à peça “Deirdre of the Sorrows”, do dramaturgo irlandês John
Millington Synge.
Referência:
YEATS, W. B. The rose of the world / A
rosa do mundo. Tradução de Péricles Eugênio da Silva Ramos. In: __________. Poemas de W. B. Yeats. Tradução,
introdução e notas de Péricles Eugênio da Silva Ramos. São Paulo, SP: Art
Editora, 1987. Em inglês: p. 52; em português: p. 53.
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