Da autoria de uma poetisa israelense com ancestrais lituanos, cuja
biografia é um rio inteiro sobremodo polêmico, o poema de hoje reverbera a sua
máxima aposta em sentidos reversos na primeira e na última linhas: o direito
que temos de lembrar (ou de esquecer) é igual (ou se assemelha) ao direito de
esquecer (ou de lembrar).
O passado pode nos fazer rememorar tanto as coisas boas quanto as más:
por que haveríamos de ficar remoendo tristezas ou insucessos já conjugados em
formas pretéritas? Tornemo-nos equilibrados emocionalmente, ainda que à vista de
um sem número de coisas opostas que se manifestam na realidade, elas mesmas derivadas
das muitas exteriorizações do Tao.
J.A.R. – H.C.
Rina Schani
(1937-1983)
Poema
Teu direito de
esquecer igual ao teu direito de lembrar.
Se não podes passar
por cima, ou abrir
A mão feito uma asa,
ou devolver
A violência dos anjos
singulares,
Teu direito de
enterrar igual ao teu direito de queimar.
Alguém pode injuriar,
vituperar
Contra ti, verter
cólera celeste de uma sulfúrea boca.
Mas teu direito de
partir igual ao teu direito de ficar,
De cantar ou de estar
quieta,
De ser pássaro ou
água ou pedras.
A ti é dado
escapulir: teu é o mundo
E a linda praça, com
seus repuxos de sol, há de esperar.
Atrela teu carro às
mais selvagens horas ou
À calma exausta.
Reúne tuas forças no teu eu.
Teu direito de
lembrar igual ao teu direito de esquecer.
Jamais esqueça de lembrar
(Adrian Doyle: pintor
australiano)
Referência:
SCHANI, Rina. Poema. Tradução de J. Guinsburg
e Zulmira Ribeiro Tavares. In: GUINSBURG, J.; TAVARES, Zulmira Ribeiro (Orgs.).
Quatro mil anos de poesia. Desenhos
de Paulina Rabinovich. São Paulo, SP: Perspectiva, 1960. p. 469. (Coleção
“Judaica”; v. 12)
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