Num poema de quatro sextilhas com esquema de rimas ababcc, o poeta
indiano descreve o ambivalente relacionamento que mantém com o seu gato
cinzento, não exatamente um gato de rua, sem eira nem beira, senão um dos
muitos que ficam a vagar pelos telhados em busca de aventuras amorosas noturnas.
E pela manhã, cheio de tropelias, em busca de alimento fácil, ele
retorna, assim como quem não quer nada, mas, de fato, a inquirir o seu dono com
os olhos de topázio, não exatamente sobre as ansiedades e inquietações que a
este assolam, senão sobre as suas próprias chances de receber o petisco desejado.
E ora, claro que o consegue!
J.A.R. – H.C.
Vikram Seth
(n. 1952)
The Stray Cat
The grey cat stirs
upon the ledge
Outside the glass doors
just at dawn.
I open it; he tries
to wedge
His nose indoors. It
is withdrawn.
He sits back to
assess my mood.
He sees me frown; he
thinks of food.
I am familiar with
his stunts.
His Grace, unfed,
will not expire.
He may be hungry, but
he hunts
When need compels
him, or desire.
Just yesterday he
caught a mouse
And yoyo’d it outside
the house.
But now he tums his
topaz eyes
Upon my eyes, which
must reveal
The private pressures
of these days,
The numb anxieties I
feel.
But no, his greyness
settles back
And yawns, and lets
his limbs go slack.
He ventures forth an
easy paw
As if in bargain.
Thus addressed,
I fetch a bowl, and
watch him gnaw
The star-shaped
nuggets he likes best.
He is permitted food,
and I
The furred indulgence
of a sigh.
Um gato ao natural
(Louis William Wain:
artista inglês)
O Gato de Rua
O gato cinza agita-se
sobre a cornija,
no frontal das portas
de vidro ao amanhecer.
Eu as abro; ele tenta
enfiar
o nariz dentro de
casa e logo se afasta.
Senta-se para avaliar
meu estado de ânimo.
Vê-me franzir o
cenho; pensa em comida.
Estou familiarizado
com as suas piruetas.
Sua Graça, se não
alimentado, não expirará.
Ele pode estar com fome,
mas vai à caça
Quando o deseja ou a
necessidade o obriga.
Ainda ontem pegou um
rato
E por sua conta
arrastou-o para fora de casa.
Mas agora põe seus
olhos de topázio
Sobre os meus olhos,
os quais devem revelar
As tensões privadas
destes dias,
As ansiedades
entorpecidas que sinto.
Não, contudo: o
acinzentado recosta-se
E boceja, deixando relaxados
os membros.
Aventura-se com uma
desembaraçada pata
Como se numa
barganha. Assim abordado,
Trago-lhe uma tigela
e o vejo rilhar os nacos
Em forma de estrela
de que mais gosta.
Ele se permite o
alimento, e eu
A indulgência furtiva
de um suspiro.
Referência:
SETH, Vikram. The stray cat. In:
THAYIL, Jeet (Ed.). 60 indian poets.
New Delhi, IN: Penguin Books India, 2008. p. 110-111.
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