Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

terça-feira, 11 de junho de 2019

Umberto Saba - Meu pai foi para mim “o assassino”

Numa espécie de autobiografia literária, Saba relembra de seu pai, Ugo Edoardo Poli (‘Saba’ era um pseudônimo), a quem veio a conhecer apenas ao 20 (vinte) anos, ele – um canalha ou delinquente – originário de uma nobre família veneziana, que abandonou sua esposa, Rachel Cohen, de origem judaica, quando Umberto ainda não havia nascido.

Ao conhecer o pai, de quem teria herdado não só a semelhança física como o “dom da poesia” – embora tencionando com ele não se parecer –, o poeta torna-se consciente de aspectos conflitantes de sua própria personalidade, compreendendo como a diversidade dos ambientes religiosos e culturais de seus genitores foi elemento suficiente para, possivelmente, ter ensejado a separação do casal.

J.A.R. – H.C.

Umberto Saba
(1883-1957)

Mio padre è stato per me “l’assassino”

Mio padre è stato per me “l’assassino”,
fino ai vent’anni che l’ho conosciuto.
Allora ho visto ch’egli era un bambino,
e che il dono ch’io ho da lui l’ho avuto.

Aveva in volto il mio sguardo azzurrino,
un sorriso, in miseria, dolce e astuto.
Andò sempre pel mondo pellegrino;
più d’una donna l’ha amato e pasciuto.

Egli era gaio e leggero; mia madre
Tùtti sentìva della vìta i pesi.
Di mano ei gli sfuggì come un pallone.

“Non somigliare – ammoniva – a tuo padre”.
Ed io più tardi in me stesso lo intesi:
erano due razze in antica tenzone.

Pai & Filho
(Lazar Krestin: pintor de origem judaica)

Meu pai foi para mim “o assassino”

Meu pai foi para mim “o assassino”,
até os vinte anos, quando o conheci,
e vi que não passava de um menino
e o dom que tenho dele recebi.

Tinha no rosto meu olhar azulino,
na dor um sorriso astuto e doce. E
vagou sempre no mundo peregrino,
amando e dormitando aqui e ali.

Era alegre e leviano, pois o peso
da vida só a minha mãe cabia.
Escapou-lhe das mãos como um balão.

“Não imites teu pai”, era o seu desejo.
Mostrou-me a experiência o que então não via:
eram raças em antiga tensão.

(Tradução publicada em
“Folhetim” em 15.7.1984)

Referências:

Em Italiano

SABA, Umberto. Mio padre è stato per me “l’assassino”. Disponível neste endereço. Acesso em: 27 mai 2019.

Em Português

SABA, Umberto. Meu pai foi para mim “o assassino”. Tradução de João Moura Jr. In: SUZUKI JR., Matinas; ASCHER, Nelson (Organizadores). Folhetim: poemas traduzidos. São Paulo, SP: Folha de São Paulo, 1987. p. 160.

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