Empregando o próprio formato do soneto, a poetisa põe-se a conjecturar
sobre a ineficácia do soneto – e, por extensão, de toda a lírica –, para
alterar um estado de coisas na vida prática. Quando muito, segundo ela, poderá
mover, emocionalmente, um pobre coitado que permaneceu sob a sua influência,
exposto ao luar – hipótese que, a princípio, não teria sido levantada por quem
o redigiu.
De fato, um poema sempre se destinaria a mover alguém, a incitar o
leitor à ação? Talvez não: um poema serve, no mais das vezes, para se apreciar
a beleza das palavras, a visão peculiar do autor sobre determinado tema, a
particularidade de pensamentos, sentimentos, emoções. É bem verdade que há belos
poemas que nos comovem ou incitam: mas, nesse caso, constituem exceção à regra,
segundo a autora.
J.A.R. – H.C.
Kate Light
(n. 1960)
I Conclude a Sonnet Never Changed
I conclude a sonnet
never changed
a mind, or moved a
heart, or opened a locked
door. If such could
be so readily arranged,
poems could not
possibly stay stocked.
Pockets would be
filled and pillows swarmed.
Oh no, a sonnet never
swung a gate,
cracked a safe, or
left a bomb disarmed.
It never swam a moat,
or pried a crate.
Or rather, whom it
moved, at any rate,
was accidental; a
side effect, some poor
someone tugged at
when its influence, its weight,
its pool of moonlight
revealed a midnight shore.
Yes, then, it may
have changed a life, or more;
but not the one it
was intended for.
Saída da Lua em Agosto
(Thomas Van Stein:
pintor norte-americano)
Chego à conclusão de que um soneto jamais
alterou
Chego à conclusão de
que um soneto jamais alterou
uma mente, moveu um
coração, ou abriu uma porta
fechada. Se tais
coisas acontecessem com frequência,
não haveria razões para
tantos poemas acumulados.
Os bolsos estariam
cheios e os travesseiros repletos.
Oh não, um soneto
jamais escancarou um portão,
Rompeu uma
caixa-forte ou desarmou uma bomba.
Nunca transpôs um
fosso ou rompeu um engradado.
Ou melhor, a quem ele
emocionou, seja como for,
foi por acidente; um
efeito colateral que arrastou
um pobre alguém quando
sua influência, seu peso,
sua poça de luar
revelou uma praia à meia-noite.
Sim, pois, pode haver
mudado uma vida ou mais;
Mas não terá sido a
que foi, a princípio, destinado.
Referência:
LIGHT, Kate. I conclude a sonnet never
changed. In: LINDNER, April (Ed.). Líneas
conectadas: nueva poesía de los Estados Unidos. Edición bilingüe: Inglés -
Español. 1st. ed. Louisville, KY: Sarabande Books, 2006. p. 264.
❁
um dos mais belos poemas que já li...
ResponderExcluirRicardo,
ResponderExcluirDe fato, é um poema muito interessante, quer pelo tema autorreferencial à própria poesia – basta ver as asserções metapoéticas nele contidas –, quer pelo sentido atribuído pela poetisa a toda criação poética, dominantemente não utilitário.
Abs.
João A. Rodrigues