Apesar de o poema nos trazer à mente as imagens de árvores, numa manhã
de inverno, como numa tela capaz, ademais, de apresentar sonoridades – seria possível?!
–, de fato, Ashbery avoca-as como uma metáfora para os relacionamentos humanos:
enceta-se o discurso sem que haja, presumivelmente, espaço para performances
gestuais.
Veja-se que a fixidez não significa a permanência em um lugar
específico, pois o poeta alude a uma relação que pode dispor cada qual num
lugar do mundo suficientemente distante do lugar do outro, em dado momento,
ainda que estejam concordes (ou discordes, quem sabe?!) com o quer que seja.
Nesse sentido, o elemento do acaso, a envolver os amantes, define-se
pelas estruturas pré-ordenadas do discurso, tão inculcadas na vida que a sua
mera presença é suficiente para garantir o significado, com os acentos do
mundo contingente a preencher tudo o mais que se pode apresentar como
reticências.
J.A.R. – H.C.
John Ashbery
(1927-2017)
Some Trees
These are amazing:
each
Joining a neighbour,
as though speech
Were a still performance.
Arranging by chance
To meet as far this
morning
From the world as
agreeing
With it, you and I
Are suddenly what the
trees try
To tell us we are:
That their merely
being there
Means something; that
soon
We may touch, love,
explain.
And glad not to have
invented
Such comeliness, we
are surrounded:
A silence already
filled with noises,
A canvas on which
emerges
A chorus of smiles, a
winter morning.
Placed in a puzzling
light, and moving,
Our days put on such
reticence
These accents seem
their own defence.
Árvores no Parque
(Leonid Afremov:
pintor israelense)
Algumas Árvores
Estas são magníficas:
cada qual
Une-se a um vizinho,
como se a fala
Fosse uma representação
fixa.
Dispondo-nos ao acaso
Para encontrar-nos
esta manhã, tão distantes
Do mundo quanto em
concordância
Com ele, tu e eu
Somos, de repente, o
que as árvores tentam
Nos dizer que somos:
Que simplesmente
estar ali
Signifique algo; que
logo
Possamos tocar, amar,
explicar.
E contentes por não
haver inventado
Semelhante beleza, deixamo-nos
rodear:
Um silêncio já pleno
de ruídos,
Uma tela sobre a qual
surge
Um coro de sorrisos,
uma manhã invernal.
Sob uma luz
desconcertante e comovedora,
Nossos dias denotam reticência
tanta
Que tais inflexões
parecem sua própria defesa.
Referência:
ASHBERY, John. Some trees. In: DOVE,
Rita (Ed.). The penguin anthology of
twentieth century american poetry. New York, NY: Penguin Books, 2013. p.
253.
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