Emprega-se neste poema a metáfora do mito de Jonas, extraído às páginas
da Bíblia, com o objetivo de se evidenciar que, para expor-se a uma realidade
mais ampla, é necessário que abramos mão de alguma coisa de que dispomos no
presente, para equipar-nos dos meios capazes de proporcionar o avanço
necessário: uma espécie de “destruição criadora”.
O poeta sente-se como se estivesse no ventre de uma baleia, “com minha
mulher e Diego e todos os meus avós”, cerceado de algum modo em relação à
realidade que o circunda: propõe-se, então, criar um periscópio a partir de uma
costela, do fígado ou de barbatanas do animal, mesmo que à custa de sua amizade...
J.A.R. – H.C.
Antonio Cisneros
(1942-2012)
Poema sobre Jonás y los desalienados
Si los hombres viven
en la barriga de una ballena
sólo pueden sentir
frío y hablar
de las manadas
periódicas de peces y de murallas
oscuras como una boca
abierta y de manadas
periódicas de peces y
de murallas
oscuras como una boca
abierta y sentir mucho frío.
Pero si los hombres
no quieren hablar siempre de lo mismo
tratarán de construir
un periscopio para saber
cómo se desordenan
las islas y el mar
y las demás ballenas –
si es que existe todo eso.
Y el aparato ha de
fabricarse con las cosas
que tenemos a la mano
y entonces se producen
las molestias, por
ejemplo
si a nuestra casa le
arrancamos una costilla
perderemos para
siempre su amistad
y si el hígado o las
barbas es capaz de matarnos.
Y estoy por creer que
vivo en la barriga de alguna ballena
con mi mujer y Diego
y todos mis abuelos.
Jonas e a Baleia
(Pieter Lastman: pintor holandês)
Poema sobre Jonas e os desalienados
Se os homens vivem na
barriga de uma baleia
só podem sentir frio
e falar
dos cardumes
periódicos de peixes e de muralhas
escuras como uma boca
aberta e de cardumes
periódicos de peixes
e de muralhas
escuras como uma boca
aberta e sentir muito frio.
Mas se os homens não
querem falar sempre da mesma coisa
tratarão de construir
um periscópio para saber
como se desordenam as
ilhas e o mar
e as demais baleias –
se é que existe tudo isso.
E o aparelho há de se
fabricar com as coisas
que temos à mão e
então surgem
desagrados, por
exemplo
se de nossa casa
arrancamos uma costela
perderemos para
sempre sua amizade
e se o fígado ou as
barbatanas, é capaz de matar-nos.
Estou achando que
vivo na barriga de alguma baleia
com minha mulher e
Diego e todos os meus avós.
Referências:
Em Espanhol
CISNEROS, Antonio. Poema sobre Jonás y
los desalienados. In: __________. Postales
para Lima: antología poética. Prólogo de Alonso Rabí do Carmo. Selección de
Jorge Boccanera. Buenos Aires, AR: Ediciones Colihue, 1999. p. 56. (Colección
‘Musarisca’)
Em Português
CISNEROS, Antonio. Poema sobre Jonas e
os desalienados. Tradução de Ferreira Gullar. In: GULLAR, Ferreira (Org.). O prazer do poema: uma antologia
pessoal. Rio de Janeiro, RJ: Edições de Janeiro, 2014. p. 256.
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