Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sexta-feira, 7 de junho de 2019

João Cabral de Melo Neto - Fábula de um arquiteto

Centrado na ideia de se abrir e fechar portas, enquanto metáfora para a oferta ou restrição de oportunidades de vida, Melo Neto associa-a a certo ato de criação de um arquiteto, levando-a às mais distintas hipóteses do que um simples movimento de abertura e fechamento de umbrais é capaz de promover.

Se tudo são aberturas para o exterior, há permissão para a luz entrar, quer no plano denotativo – vinda da difusão dos raios solares –, quer no conotativo – pois somos também parte das ideias que nos transmitem os pares. Mas se nos fechamos, vedamos portas e janelas, retornamos ao estado primordial da “capela-útero” e, sob o estatuto do medo, não seremos mais genuinamente livres.

J.A.R. – H.C.

João Cabral de Melo Neto
(1920-1999)

Fábula de um arquiteto

A arquitetura como construir portas,
de abrir; ou como construir o aberto;
construir, não como ilhar e prender,
nem construir como fechar secretos;
construir portas abertas, em portas;
casas exclusivamente portas e teto.
O arquiteto: o que abre para o homem
(tudo se sanearia desde casas abertas)
portas por-onde, jamais portas-contra;
por onde, livres: ar luz razão certa.

2.

Até que, tantos livres o amedrontando,
renegou dar a viver no claro e aberto.
Onde vãos de abrir, ele foi amurando
opacos de fechar; onde vidro, concreto;
até refechar o homem: na capela útero,
com confortos de matriz, outra vez feto.

Em: “A educação pela pedra” (1962-1965)

Igreja de Santo Alexandre
(Tytus Brzozowski: artista polonês)

Referência:

MELO NETO, João Cabral de. Fábula de um arquiteto. In: __________. Da educação pela pedra à pedra do sono: antologia poética. 1. ed. São Paulo, SP: Círculo do Livro, 1986. p. 21.

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