Há um estranhamento incapaz de ser vencido entre os amantes, mesmo com
toda a intimidade que possam ter, a configurar um binômio que alcança as raias
do antitético – erotismo x conhecimento –, impregnado pelas imagens de
inacessibilidade ao pensar, a saber, “apalpar com os olhos” e “olhar com as
mãos”, numa inversão dos sentidos frente às partes do corpo que os viabilizam.
No curso das horas, o poeta revela consciência de sua mortalidade, ao evocar
o afiar das navalhas em meio à celebração de sua contemplação, a intimidade e o
silêncio a reverberar nessa planície inabitada, onde o tempo se conta antes do
começo ou depois do fim, embora tudo sempre se vivencie no agora!
J.A.R. – H.C.
Octavio Paz
(1914-1998)
Antes del comienzo
Ruidos confusos,
claridad incierta.
Otro día comienza.
Es un cuarto en
penumbra
y dos cuerpos
tendidos.
En mi frente me
pierdo
por un llano sin
nadie.
Ya las horas afilan
sus navajas.
Pero a mi lado tú
respiras;
entrañable y remota
fluyes y no te
mueves.
Inaccesible si te
pienso,
con los ojos te
palpo,
te miro con las
manos.
Los sueños nos
separan
y la sangre nos
junta:
somos un río de
latidos.
Bajo tus párpados
madura
la semilla del sol.
El mundo
no es real todavía,
el tiempo duda:
sólo es cierto
el calor de tu piel.
En tu respiración
escucho
la marea del ser,
la sílaba olvidada
del Comienzo.
Os Amantes
(Giulio Romano:
pintor italiano)
Antes do começo
Ruídos confusos,
claridade incerta.
Outro dia começa.
É um quarto em
penumbra
e dois corpos
estendidos.
À minha frente
perco-me numa
planície sem ninguém.
E as horas afiam suas
navalhas.
Mas a meu lado tu
respiras;
íntima e remota
fluis e não te moves.
Inacessível se te
penso,
com os olhos te
apalpo,
te vejo com as mãos.
Os sonhos nos separam
e o sangue nos une:
somos um rio de
pulsações.
Sob tuas pálpebras
amadurece
a semente do sol.
O mundo
ainda não é real,
o tempo hesita:
certo é somente
o calor de tua pele.
Em tua respiração
escuto
a maré do ser,
a sílaba esquecida do
Começo.
Referência:
PAZ, Octavio. Antes del comienzo. In:
__________. Obras completas. Obra
poética II: 1969-1998. Árbol adentro: 1976-1988. Tomo XII. Edición del autor.
1. ed. México, DF: Fondo de Cultura Económica, 2004. p. 161. (Letras Mexicanas)
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