Recorrer
ao mundo animal para, com recursos simbólicos ou metafóricos, expressar ideias
as mais diversas parece ter sido o hobby de Moore, que vai até as últimas consequências
em seus experimentalismos: mesmo aqui no bloguinho já postamos um poema por ela
dedicado ao caracol. Com
efeito, a poetisa tem certa preferência por animais – como diria? – esquisitos,
exceto o gato, obviamente, um dos poucos bichos domésticos que aparece em seus
versos.
O
título do poema em epígrafe faz-nos supor que Marianne o dedica a uma girafa,
mas, de fato, os versos que o compõe permitem-nos ver que ela é apenas o tema à
volta do qual gira o poema. No fundo, a girafa representa uma condição
atribuível ao ser humano: você precisa ser uma delas, vale dizer, um animal
bastante exótico, para alcançar as “folhas superiores”.
J.A.R.
– H.C.
Marianne Moore
(1887-1972)
To a
giraffe
If it
is unpermissible, in fact fatal
to be
personal and desirable
to be
literal – detrimental as well
if
the eye is not innocent – does it mean that
one
can live only on top leaves that are small
reachable
only by a beast that is tall? –
of
which the giraffe is the best example –
the
unconversational animal.
When
plagued by the psychological,
a
creature can be unbearable
that
could have been irresistible;
or to
be exact, exceptional
since
less conversational
than
some emotionally-tied-in-knots animal.
After
all
consolations
of the metaphysical
can
be profound. In Homer, existence
is
flawed; transcendence, conditional;
“the
journey from sin to redemption, perpetual.”
In:
“Tell me, tell me” (1966)
Mamãe Girafa
(Lucie Bilodeau: pintora canadense)
A uma
girafa
Se é
inadmissível, de fato fatal,
ser
pessoal e indesejável
ser
literal – e até mau, por sinal,
se o
olho não é inocente – será que
se
pode viver só das folhinhas do alto
acessíveis
só a um bicho escomunal? –
do
qual o melhor exemplo é a girafa –
o
inconversável animal.
Quando
o psíquico o deixa mal,
um
ser que teria sido insuperável
pode
muito bem se tomar insuportável;
ou,
mais exato, excepcional,
já
que bem menos conversável
que
um animal com algum bloqueio emocional.
Afinal,
pode
bem ser abismal
o
alívio metafísico. Em Homero, a vida
é
falha; a transcendência, condicional;
“a
via do pecado à redenção, eternal”.
Em:
“Me diz, me diz” (1966)
Referência:
MOORE,
Marianne. To a giraffe. Tradução de José Antonio Arantes. In: __________. Poemas.
Seleção de João Moura Jr. Tradução e posfácio de José Antonio Arantes. São
Paulo, SP: Companhia das Letras, 1991. Em inglês: p. 156; em português: 157.
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