Múcio concebe o poeta como um louco, atrás de um fogo-fátuo representado
pela glória: muitos houve na história que replicaram esse enredo. E ainda os
há. Outros tantos, todavia, foram tão grandes, que seus nomes se mantiveram não
exatamente como um “fogo-fátuo”, senão como referências indeléveis na narrativa
da literatura ocidental, como Homero, Dante, Shakespeare ou Hugo.
Tudo transcorre como numa escalada, ao fim da qual nem todos logram
alcançar o topo do Olimpo da poesia, sendo abandonados à margem do caminho
pelas musas, passando a configurar, então, meros insucessos cuja urdidura reverte-se,
inapelavelmente, ao pó primordial.
J.A.R. – H.C.
Múcio Teixeira
(1857-1926)
O Poeta e a Glória
(a Fernandes Costa)
Na vazia extensão de
um areal deserto,
Sem oásis, sem luz,
sem brisas, sem perfumes,
Triste como uma
esposa em noite de ciúmes,
Vagava um louco atrás
dum fogo-fátuo, incerto.
Quando tremeluzia
esse clarão mais perto,
Seu vulto aparecia,
além, entre os negrumes;
Mal se iam apagando
os oscilantes lumes,
Perdia-se de vista o
sonhador desperto.
Impelido, talvez, por
um febril desejo,
Na voragem fatal de
uma esperança inglória,
Dos lagos aos paúes,
do roseiral ao brejo, (*)
Ia, como o Hebreu da
sacrossanta história;
E nós vamos também...
Ah! mas eu penso e vejo
Que esse louco é o
Poeta e o fogo-fátuo a Glória!
O poeta árabe (persa)
(Gustave Moreau:
pintor francês)
Nota:
(*). A palavra “paúes”, com essa
grafia, ainda aparece em dicionários de origem portuguesa, a significar
“pântano, “charco”. Em dicionários brasileiros, a grafia corrente tornou-se
“paul” (plural: pauis), mantido o mesmo significado.
Referência:
TEIXEIRA, Álvaro de Múcio. O poeta e a
glória. In: __________. Poesias.
Tomo II. Livro II: Mocidade. Rio de Janeiro: H. Garnier Livreiro-Editor, 1903.
p. 51.
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