Trago aqui, em ortografia atualizada,
um poema do poeta maranhense a descrever cena que muito se parece às
vivenciadas num cenário amazônico: chuvas torrenciais, trovões e raios
infernais – e o grande rio a uma velocidade que a tudo arrasa em suas margens,
revolvendo ininterruptamente o seu leito.
Tem-se, paralelamente, a indefectível
comparação que se faz do rio àqueles que marcham, em resoluta convicção, no
rumo adotado, “fecundando o dever em cada consciência”, “nutrindo de amor os
corações incultos”, pouco dando azo aos insultos e à insolência dos que
desdenham, presumivelmente, o poder da razão e da ciência.
J.A.R. – H.C.
Teófilo Dias de Mesquita
(1854-1889)
(1854-1889)
O Rio e o Vento
(A Pereira da Costa)
Muitas vezes se vê,
sobre os rios do Norte,
Na quadra em que o
calor abafa mais ardente,
Horríssono tufão
rugir, sanhudo e forte,
Em direção contrária à
indômita corrente.
Frenéticos pegões,
com impávidos roncos,
Arrancados com fúria às
validas entranhas,
No impetuoso correr
lascam os velhos troncos,
E fazem desabar as
pedras das montanhas.
De encontro às águas
rui a túrbida descarga,
E em brusco assalto
ferve, e remoinha e brama;
– Sem cólera,
encrespando a superfície larga,
Através da floresta o
rio se derrama.
Como um atleta, o
vento, em porfiado esforço,
Cava a úmida arena; –
o rio, que se empola,
Sob a afronta
eriçando o majestoso dorso,
Com lento passo igual
à rude massa rola.
Apenas, nesse dorso
hercúleo, que fumega,
Brincam da espuma
errante os fervidos matizes,
E ele vai fecundando
as regiões, que rega,
Nutrindo e avigorando
as sôfregas raízes.
Ideal! ideal! tu és
como esse rio!
– Sem ouvir o clamor dos
cetros, das tiaras,
Com grave placidez,
imperturbável, frio,
Vais rolando em triunfo
as tuas ondas claras.
Embalde sobre ti a
bava dos insultos
O preconceito cospe,
e golfeja a insolência:
– Vais nutrindo de
amor os corações incultos,
Fecundando o dever em
cada consciência.
Fatigando ao passado
a resistência, a fúria,
Marchas para o futuro
inalteravelmente;
Não te pôde sustar a
força, nem a injúria:
– O
tufão não suspende aos rios a corrente!
Rio sob Ventania em Wyoming
(Albert Bierstadt:
pintor germano-americano)
Elucidário:
Horríssono – que faz um som pavoroso,
aterrador;
Sanhudo – temível, terrível;
Pegões – fortes ventanias;
Validas – protegidas, preservadas;
Túrbida – transtornante, inquietante;
Bava – saliva, baba;
Golfeja – expele, escarra.
Referência:
MESQUITA, Teófilo Dias de. O rio e o
vento. In: OLIVEIRA, Alberto de (Edição e seleção). Páginas de ouro da poesia brasileira. Rio de Janeiro: H. Harnier,
1911. p. 376-377.
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