Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

segunda-feira, 18 de junho de 2018

Teófilo Dias de Mesquita - O Rio e o Vento ‎

Trago aqui, em ortografia atualizada, um poema do poeta maranhense a descrever cena que muito se parece às vivenciadas num cenário amazônico: chuvas torrenciais, trovões e raios infernais – e o grande rio a uma velocidade que a tudo arrasa em suas margens, revolvendo ininterruptamente o seu leito.

Tem-se, paralelamente, a indefectível comparação que se faz do rio àqueles que marcham, em resoluta convicção, no rumo adotado, “fecundando o dever em cada consciência”, “nutrindo de amor os corações incultos”, pouco dando azo aos insultos e à insolência dos que desdenham, presumivelmente, o poder da razão e da ciência.

J.A.R. – H.C.

Teófilo Dias de Mesquita
(1854-1889)

O Rio e o Vento

(A Pereira da Costa)

Muitas vezes se vê, sobre os rios do Norte,
Na quadra em que o calor abafa mais ardente,
Horríssono tufão rugir, sanhudo e forte,
Em direção contrária à indômita corrente.

Frenéticos pegões, com impávidos roncos,
Arrancados com fúria às validas entranhas,
No impetuoso correr lascam os velhos troncos,
E fazem desabar as pedras das montanhas.

De encontro às águas rui a túrbida descarga,
E em brusco assalto ferve, e remoinha e brama;
– Sem cólera, encrespando a superfície larga,
Através da floresta o rio se derrama.

Como um atleta, o vento, em porfiado esforço,
Cava a úmida arena; – o rio, que se empola,
Sob a afronta eriçando o majestoso dorso,
Com lento passo igual à rude massa rola.

Apenas, nesse dorso hercúleo, que fumega,
Brincam da espuma errante os fervidos matizes,
E ele vai fecundando as regiões, que rega,
Nutrindo e avigorando as sôfregas raízes.

Ideal! ideal! tu és como esse rio!
– Sem ouvir o clamor dos cetros, das tiaras,
Com grave placidez, imperturbável, frio,
Vais rolando em triunfo as tuas ondas claras.

Embalde sobre ti a bava dos insultos
O preconceito cospe, e golfeja a insolência:
– Vais nutrindo de amor os corações incultos,
Fecundando o dever em cada consciência.

Fatigando ao passado a resistência, a fúria,
Marchas para o futuro inalteravelmente;
Não te pôde sustar a força, nem a injúria:
– O tufão não suspende aos rios a corrente!

Rio sob Ventania em Wyoming
(Albert Bierstadt: pintor germano-americano)

Elucidário:

Horríssono – que faz um som pavoroso, aterrador;
Sanhudo – temível, terrível;
Pegões – fortes ventanias;
Validas – protegidas, preservadas;
Túrbida – transtornante, inquietante;
Bava – saliva, baba;
Golfeja – expele, escarra.

Referência:

MESQUITA, Teófilo Dias de. O rio e o vento. In: OLIVEIRA, Alberto de (Edição e seleção). Páginas de ouro da poesia brasileira. Rio de Janeiro: H. Harnier, 1911. p. 376-377.

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