Vemos aqui o tema do
poema migrar do assunto que lhe dá título a outro mais próximo aos enunciados
mandamentais dos ecologistas. Com efeito, a princípio, o poeta se vê como um
músico que perdeu um amigo, mas que continua a fazer arte recorrendo à “mediania”
de seu violino, de sorte a produzir poemas que mais se parecem a canções
tocadas em antigos espetáculos.
Ao fim, pondera sobre a forma como ele
e o falecido amigo andaram a degradar o estado imaculado da natureza, tudo para
exteriorizar as suas capacidades, sem atentar, todavia, para o fato de que esse
mesmo espaço é o que será legado às gerações futuras, merecendo de cada um de
nós, por conseguinte, os necessários cuidados de preservação enquanto aqui
estivermos.
J.A.R. – H.C.
John Ashbery
(1927-2017)
Street Musicians
One died, and the soul was wrenched out
Of the other in life, who, walking the
streets
Wrapped in an identity like a coat,
sees on and on
The same corners, volumetrics, shadows
Under trees. Farther than anyone was
ever
Called, through increasingly suburban
airs
And ways, with autumn falling over
everything:
The plush leaves the chattels in
barrels
Of an obscure family being evicted
Into the way it was, and is. The other
beached
Glimpses of what the other was up to:
Revelations at last. So they grew to
hate and forget each other.
So I cradle this average violin that
knows
Only forgotten showtunes, but argues
The possibility of free declamation
anchored
To a dull refrain, the year turning
over on itself
In November, with the spaces among the
days
More literal, the meat more visible on
the bone.
Our question of a place of origin hangs
Like smoke: how we picnicked in pine
forests,
In coves with the water always seeping
up, and left
Our trash, sperm and excrement
everywhere, smeared
On the landscape, to make of us what we
could.
Músicos de Rua I: em
Praga
(Miki de Goodaboom:
pintora francesa)
Músicos de Rua
Morreu um deles, e a alma foi arrancada
ao outro
Em vida, o qual, caminhando pelas ruas
Envolto em uma identidade como um
casaco, vê incessantemente
As mesmas esquinas, volumetrias,
sombras
Sob as árvores. Mais distante do que
jamais alguém
Fora chamado, através de ares e rotas
cada vez mais
Suburbanas, com o outono caindo sobre
tudo:
O peluche desfaz-se dos móveis nas
barricas
De uma obscura família sendo
desalojada,
Assim como estava e ainda está. Um
captou
De relance o que o outro estava
fazendo:
Revelações enfim. Passaram então ao
ódio e desdém mútuos.
Então faço percutir este violino
ordinário que só conhece
Esquecidas canções de musicais, embora
advogue
Ser possível a livre declamação
ancorada
A um refrão fastidioso, o ano a
revirar-se sobre si mesmo
Em novembro, com os espaços entre os
dias repetindo-se
Com exatidão, a carne já mais visível
sobre o osso.
Nosso dilema principiológico flutua
feito fumaça:
Como pudemos nos repastar em bosques de
pinheiros,
Com água sempre vertendo nas enseadas,
de forma a deixar
Nosso lixo, esperma e excremento por
toda parte, maculando
A paisagem, tudo para nos certificar do
que éramos capazes.
Referência:
ASHBERY, John. Street musicians. In:
POULIN JR., A. (Ed.). Contemporary american poetry. 6th. Ed. Boston, MA:
Houghton Mifflin Company, 1996. p. 18.
❁
Nenhum comentário:
Postar um comentário