O poeta, enquanto
médico, deve ter presenciado inúmeras vezes, em Berlim (AL), a cena ora
descrita: mulheres pobres – prostitutas, prisioneiras, párias –, em trabalho de
parto, são orientadas pelo obstetra para levar as circunstâncias a contento,
trazendo à luz os filhos “ungidos” por urina e excrementos.
Um rápido escólio: ao
verter o poema ao português, julguei, ao final, que houvesse me equivocado com
as cifras que nele constam – treze, doze e onze –, mas ao me certificar da não
existência de falha, ficou-me a impressão de que o autor estivesse aludindo ao
número de apóstolos de Cristo, o ungido, computando-se ele próprio entre os
treze, não se inserindo entre os doze e menos ainda, sem Judas, entre os onze.
Ou tudo terá sido mera coincidência?...
J.A.R. – H.C.
Gottfried Benn
(1886-1956)
Saal der Kreissenden Frauen
Die ärmsten Frauen von Berlin
– dreizehn Kinder in anderthalb Zimmern,
Huren, Gefangene, Ausgestossene –
krümmen hier ihren Leib und wimmern.
Es wird nirgends so viel geschrien.
Es wird nirgends Schmerzen und Leid
so ganz und gar nicht wie hier beachtet,
weil hier eben immer was schreit.
“Pressen Sie, Frau! Verstehn Sie, ja?
Sie sind nicht zum Vergnügen da.
Ziehn Sie die Sache nicht in die Länge.
Kommt auch Kot bei dem Gedränge!
Sie sind nicht da, um auszuruhn.
Es kommt nicht selbst. Sie müssen was tun!”
Schliesslich kommt es: bläulich und klein.
Urin und Stuhlgang salben es ein.
Aus elf Betten mit Tränen und Blut
grüsst es ein Wimmern als Salut.
Nur aus zwei Augen bricht ein Chor
Von Jubilaten zum Himmel empor.
Durch dieses kleine fleischerne Stück
wird alles gehen: Jammer und Glück.
Und stirbt es dereinst in Röcheln und Qual,
Liegen zwölf andere in disem saal.
Cena de Parto
(Pintura francesa anônima)
Sala de Parturientes
As mulheres mais pobres de Berlim
– treze meninas em uma sala e meia,
prostitutas, prisioneiras, párias –
aqui se contorcem e gemem.
Em nenhum outro lugar há tanto grito.
Em nenhum outro lugar a dor e o sofrimento
são tão completamente ignorados,
Pois aqui há sempre algo que grita sem cessar.
“Pressione, mulher! Porventura não entende?
Você não está aqui para se divertir.
Não torne as coisas tão demoradas.
Que venham também as fezes com a pressão!
Você não está aqui para matar o tempo.
Não sairá sozinho. Você tem que fazer algo!”
Finalmente aparece: azulado e pequeno.
A urina e as fezes o ungem.
Em onze leitos de lágrimas e sangue
há uma gemido como saudação.
Um coro irrompe não mais que de dois olhos
para dar júbilos aos céus.
Por esta pequena porção de carne
tudo há de passar: miséria e felicidade.
E acaso morra em estertores e agonias,
Outros doze preencherão esta sala.
Referência:
BENN, Gottfried. Saal
der kreissenden frauen. In: KAUFMANN, Walter (Editor, translator and introducer). Twenty
german poets. A bilingual collection: german x english. 1st. printing. New
York, NY: Random House, 1962. p. 272.
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