O poeta vê muito de si como o mel que perdura nas páginas que traz à luz,
enquanto elemento capaz de atrair leitores mesmo quando já houver partido deste
mundo: a obra, uma vez aberta, assemelha-se ao seu esquife descerrado, a
oferecer guloseimas a todos nós – os “ursos” que estamos à cata de mensagens...
melífluas.
Seriam mesmo mensagens “melífluas” o que procuramos? Ou tudo não passaria
de simples metáfora, o mel podendo ser substituído, por exemplo, por um ímã ou algo
fascinante e sedutor? O que importa é o máximo de relevância no escrito, para
que ele possa vencer, por décadas, centúrias ou milênios, a prova cabal do
tempo!
J.A.R. – H.C.
Robert Lowell
(1917-1977)
Reading Myself
Like thousands I took
just pride and more than just,
struck matches that brought
my blood to a boil;
I memorized the tricks
to set the river on fire –
somehow never wrote
something to go back to.
Can I suppose I am
finished with wax flowers
and have earned my
grass on the minor slopes of Parnassus...
No honeycomb is built
without a bee
adding circle to
circle, cell to cell,
the wax and honey of
a mausoleum –
this round dome
proves its maker is alive;
the corpse of the
insect lives embalmed in honey,
prays that its
perishable work live long
enough for the sweet
tooth bear to desecrate –
this open book... my
open coffin.
Leitura Noturna
(Delphin Enjolras:
pintora francesa)
A Mim Mesmo Decifrando
Como milhares, saturei-me
só de orgulho e mais do
que o razoável,
risquei fósforos que
levaram o meu sangue a ferver;
memorizei as artimanhas
para atear fogo ao rio –
seja como for, jamais
escrevi algo para voltar atrás.
Posso supor que findei
com um buquê de flores de cera,
havendo colhido erva
nas ladeiras menores do Parnaso...
Não se constrói nenhuma
colmeia sem uma abelha
a acrescer círculo ao
círculo, célula à célula,
a cera e o mel de um
mausoléu –
este domo redondo prova
que o seu autor está vivo;
os despojos do inseto
vivem embalsamados no mel,
rogando para que o
seu efêmero trabalho subsista o tempo
suficiente para que o
urso glutão por doces o profane –
este livro aberto...
meu descerrado esquife.
Referência:
LOWELL, Robert. Reading myself. In:
McCLATCHY, J. D. (Ed.). The vintage book
of contemporary american poetry. 2nd ed. New York, NY: Vintage Books (A Division of Random House Inc.), march 2003. p. 19.
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