Alpes Literários

Alpes Literários

Subtítulo

UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

terça-feira, 24 de abril de 2018

Robert Lowel - A Mim Mesmo Decifrando

O poeta vê muito de si como o mel que perdura nas páginas que traz à luz, enquanto elemento capaz de atrair leitores mesmo quando já houver partido deste mundo: a obra, uma vez aberta, assemelha-se ao seu esquife descerrado, a oferecer guloseimas a todos nós – os “ursos” que estamos à cata de mensagens... melífluas.

Seriam mesmo mensagens “melífluas” o que procuramos? Ou tudo não passaria de simples metáfora, o mel podendo ser substituído, por exemplo, por um ímã ou algo fascinante e sedutor? O que importa é o máximo de relevância no escrito, para que ele possa vencer, por décadas, centúrias ou milênios, a prova cabal do tempo!

J.A.R. – H.C.

Robert Lowell
(1917-1977)

Reading Myself

Like thousands I took just pride and more than just,
struck matches that brought my blood to a boil;
I memorized the tricks to set the river on fire –
somehow never wrote something to go back to.
Can I suppose I am finished with wax flowers
and have earned my grass on the minor slopes of Parnassus...
No honeycomb is built without a bee
adding circle to circle, cell to cell,
the wax and honey of a mausoleum –
this round dome proves its maker is alive;
the corpse of the insect lives embalmed in honey,
prays that its perishable work live long
enough for the sweet tooth bear to desecrate –
this open book... my open coffin.

Leitura Noturna
(Delphin Enjolras: pintora francesa)

A Mim Mesmo Decifrando

Como milhares, saturei-me só de orgulho e mais do
que o razoável,
risquei fósforos que levaram o meu sangue a ferver;
memorizei as artimanhas para atear fogo ao rio –
seja como for, jamais escrevi algo para voltar atrás.
Posso supor que findei com um buquê de flores de cera,
havendo colhido erva nas ladeiras menores do Parnaso...
Não se constrói nenhuma colmeia sem uma abelha
a acrescer círculo ao círculo, célula à célula,
a cera e o mel de um mausoléu –
este domo redondo prova que o seu autor está vivo;
os despojos do inseto vivem embalsamados no mel,
rogando para que o seu efêmero trabalho subsista o tempo
suficiente para que o urso glutão por doces o profane –
este livro aberto... meu descerrado esquife.

Referência:

LOWELL, Robert. Reading myself. In: McCLATCHY, J. D. (Ed.). The vintage book of contemporary american poetry. 2nd ed. New York, NY: Vintage Books (A Division of Random House Inc.), march 2003. p. 19.

Nenhum comentário:

Postar um comentário