A poetisa norte-americana dialoga com as ideias veiculadas pelos
preceitos budistas, em especial sobre o fato de que não devemos nos apegar
demais às coisas, pois o desejo arraigado seria a fonte de todo o sofrimento, visto
que jamais nos sentiremos plenamente saciados, e, de desejo em desejo, a alma poderá
vir a aportar, sem o querer, no reino da frustração.
Peacock bem percebe que os desejos não se encontram num mesmo plano de
equivalência, senão que apresentam níveis de precedência. Assim, o alcance da
redenção divina não se pode equipar ao desejo mundano de se adquirir um novo
traje da última moda.
Por outra via, é claro, os ensinamentos de Buda parecem expressar à
perfeição o que ocorre com certos indivíduos que por mais que tenham, por muito
mais anelam no plano material – deixando à míngua qualquer pretensão de
evolução espiritual, mesmo porque são incapazes de exibir sentimentos de
compaixão pelo próximo.
J.A.R. – H.C.
Molly Peacock
(n. 1947)
Why I am not a buddhist
I love desire, the
state of want and thought
of how to get;
building a kingdom in a soul
requires desire. I
love the things I’ve sought –
you in your beltless
bathrobe, tongues of cash that loll
from my billfold –
and love what I want: clothes,
houses, redemption.
Can a new mauve suit
equal God? Oh no,
desire is ranked. To lose
a loved pen is not
like losing faith. Acute
desire for nut gateau
is driven out by death,
but the cake on its
plate has meaning,
even when love is
endangered and nothing matters.
For my mother,
health; for my sister, bereft,
wholeness. But why is
desire suffering?
Because want leaves a
world in tatters?
How else but in
tatters should a world be?
A columned porch set
high above a lake.
Here, take my money.
A loved face in agony,
the spirit gone.
Here, use my rags of love.
Buda Reclinado
(Yuliya Glavnaya:
artista russa)
Por que não sou budista
Amo o desejo, o
estado de necessidade e a ideia
de como conseguir;
construir o reino numa alma
requer o desejo. Amo
as coisas que busquei –
você em seu roupão de
banho não cintado, as línguas
de dinheiro que
pendem
de minha carteira – e
amo o que me apetece: roupas,
casas, redenção. Acaso
um novo traje cor de malva
iguala-se a Deus? Oh,
não, o desejo é categorizado.
Perder uma caneta
dileta não é como perder a fé.
O desejo agudo por um
bolo de nozes é afastado
pela morte,
contudo o bolo em seu
prato tem um significado,
ainda quando o amor
periga e já nada importa.
Para minha mãe,
saúde; para minha irmã, despojada,
integridade. Mas por
que o desejo é sofrimento?
Por que o apego deixa
o mundo em farrapos?
De que outra forma
deveria estar o mundo senão
em farrapos?
Um pórtico com colunas a um nível mais elevado
que um lago.
Olhe, sirva-se do meu dinheiro. Um rosto amado
em agonia,
o espírito que se foi. Tome, use os meus trapos de amor.
Referência:
PEACOCK, Molly. Why I am not a buddhist.
In: GWYNN, R. S.; LINDNER, April (Eds.). Contemporary
american poetry. 1. ed. New York, NY: Longman, 2004. p. 345. (“Penguin
Academics Series”)
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