Tufic apresenta a sua concepção da poética, muito bem delimitada – como
se pode depreender dos parênteses à volta do verbete –, a transcorrer numa
linguagem não exatamente escrita ou oral, parece-me, mas exatamente não verbal –
como “aroma de rosa a se cumprir num outro idioma”.
Na cartografia deste poema quase não se percebe o soneto com versos
livres e brancos, muito embora explícito se aviste o discurso metalinguístico
que deplora das criações poéticas centradas em temáticas nefelibatas,
preferindo o poeta a imersão na autêntica realidade do cotidiano, como um peixe
circundado pelas águas do mar, qual um missionário da poesia, que já longe vai
com suas rotas sandálias.
J.A.R. – H.C.
Jorge Tufic
(n. 1930)
(Poética)
Comunicar-me? Antes
seja com a vida
que me circunda,
enigma sem palavras.
Depois o resto: a
seca geografia
dos léxicos varridos
pela fuga
dos centauros
bordados pela chuva.
Me deixo então fluir
secretamente
em tudo que me amplia
ou me reduz
– meu corpo sobre
lâminas imóvel
– minhas sandálias
rotas de evangelho.
Agora, sim, de posse
da linguagem
que me habilita, como
o peixe ao mar,
comunico ao leitor
possivelmente
algo mais do que sou
– talvez aroma
de rosa a se cumprir
num outro idioma.
Em: “Lâmina agreste” (1978)
O Chamado de São Pedro e Santo André
(Caravaggio: pintor
italiano)
Referência:
TUFIC, Jorge. (Poética). In: SEFFRIN,
André (Seleção e Prefácio). Roteiro da
poesia brasileira: anos 50. 1. ed. São Paulo, SP: Global, 2007. p. 170.
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