Quem ao ler este poema de Quental não teria percebido, como este
comentador, a clara conexão temática com outro poema, de mesmo título, já aqui postado, de autoria do escritor e diplomata brasileiro Múcio Teixeira?! E
fiquei a perguntar-me se Múcio não sofrera a influência direta do vate
lusitano, haja vista que o seu poema é datado de 1909, momento em que Antero já
havia falecido.
Do reino mineral ao animal, e de animal a homem – passo mais adiantado
da evolução –, enquanto criatura dotada de livre-arbítrio e de ponderações
éticas e consequencialistas, sabendo discernir, em sua liberdade de ação, entre
os frutos do bem e do mal. Alguma alusão bíblica nessa narrativa?! (rs)
J.A.R. – H.C.
Antero de Quental
(1842-1891)
Evolução
(A Santos Valente)
Fui rocha, em tempo,
e fui, no mundo antigo,
tronco ou ramo na
incógnita floresta...
Onda, espumei,
quebrando-me na aresta
Do granito,
antiquíssimo inimigo...
Rugi, fera talvez,
buscando abrigo
Na caverna que
ensombra urze e giesta;
O, monstro primitivo,
ergui a testa
No limoso paul,
glauco pascigo...
Hoje sou homem – e na
sombra enorme
Vejo, a meus pés, a
escada multiforme,
Que desce, em
espirais, da imensidade...
Interrogo o infinito
e às vezes choro...
Mas, estendendo as
mãos no vácuo, adoro
E aspiro unicamente à
liberdade.
Aviação: evolução das formas
sob limitações aerodinâmicas
(Arshile Gorky:
pintor armênio-americano)
Elucidário:
Urze – designação dada a várias plantas
arbustivas da família das ericáceas;
Giesta – designação dada a várias
plantas arbustivas da família das fabáceas;
Paul – pântano, terreno alagado com
água estagnada;
Glauco – esverdeado;
Pascigo – pasto.
Referência:
QUENTAL, Antero. Evolução. In:
__________. Sonetos. Selecção e
apresentação de Ana Maria Almeida Martins. 1. ed. Lisboa, PT: Editorial
Presença, dez. 1996. p. 61. (“Centro de Estudos Anterianos”)
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