O problema de re(construir) a si próprio
tendo o próximo como espelho, numa espiral que promove o surgimento de uma treva
perpétua de dor, da qual resulta a construção de realidades amenas voltadas apenas
a satisfazer uns “olhos duros”: eis o infortúnio que inquieta a poetisa...
E tal perspectiva também é válida para
os outros em relação a cada um de nós: os olhos que nos contemplam esperam
reciprocidade, levando à exaustão os nossos mananciais e reforçando a espiral
que nos cerceia a liberdade plena.
J.A.R. – H.C.
Hilda Hilst
(1930-2004)
Passeio 15 -
Trajetória Poética do Ser
De delicadezas me
construo. Trabalho umas rendas
Uma casa de seda para
uns olhos duros.
Pudesse livrar-me da
maior espiral
Que me circunda e
onde sem querer me reconstruo!
Livrar-me de todo
olhar que quando espreita, sofre
O grande desconforto
de ver além dos outros.
Tenho tido esse olhar.
E uma treva de dor
Perpetuamente.
Do êxodo dos
pássaros, do mais triste dos cães,
De uns rios pequenos
morrendo sobre um leito exausto.
Livrar-me de mim
mesma. E que para mim construam
Aquelas delicadezas,
umas rendas, uma casa de seda
Para meus olhos
duros.
Um Mundo no Íntimo
(Jim Warren: artista
norte-americano)
Referência:
HILST, Hilda. Passeio 51 - Trajetória
poética do ser. Exercícios. In: __________. Uma superfície de gelo ancorada
no riso: antologia de Hilda Hilst. Seleção, organização e apresentação de
Luisa Destri. São Paulo, SP: Globo, 2012. p. 52.
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