Este poema, visualmente apresentado
como três seções interconectadas com claras modulações marxistas, foi escrito
em 1939 por Brecht, na Dinamarca, para onde ele havia partido, em fuga do
regime nazista, então a promover um catálogo de indignidades.
As suas estrofes, sobretudo as
derradeiras, estão carregadas de pesar e ansiedade. Desapontado, recorre à
posteridade para que pondere, antes de condenar a sua geração, sobre as
terríveis circunstâncias vividas pelo povo alemão naquele momento,
instrumentalizado por uma ideologia destrutiva.
J.A.R. – H.C.
Bertolt Brecht
(1898-1956)
An die Nachgeborenen
I
Wirklich, ichlebe in finsterenZeiten!
Das argloseWortisttöricht. EineglatteStirn
Deutet auf Unempfindlichkeithin. Der Lachende
Hat die furchtbareNachricht
Nurnochnichtempfangen.
Was sind das fürZeiten, wo
EinGesprächüberBäume fast einVerbrechenist
Weil eseinSchweigenüber so vieleUntateneinschließt!
Der dortruhigüber die Straßegeht
Istwohlnichtmehrerreichbarfür seine Freunde
Die in Not sind?
Esistwahr: ichverdienenochmeinenUnterhalt
Aber glaubtmir: das istnureinZufall. Nichts
Von dem, was ichtue, berechtigtmichdazu,
michsattzuessen.
Zufällig bin ichverschont. (Wennmein Glück
aussetzt, bin ichverloren.)
Man sagtmir: Iß und trink du! Sei froh, daßduhast!
Aber wiekannichessen und trinken, wenn
Ich den Hungerndenentreiße, was ichesse, und
Mein GlasWassereinemVerdurstendenfehlt?
Und dochesseundtrinkeich.
Ichwäregerneauchweise.
In den altenBüchernsteht, was weiseist:
SichausdemStreit der Welt halten und die kurzeZeit
OhneFurchtverbringen
AuchohneGewaltauskommen
BösesmitGutemvergelten
Seine Wünschenichterfüllen, sondernvergessen
Gilt fürweise.
Alles das kannichnicht:
Wirklich, ichlebe in finsterenZeiten!
II
In die StädtekamichzurZeit der Unordnung
Als da Hunger herrschte.
Unter die Menschen kamichzurZeit des Aufruhrs
Und ichempörtemichmitihnen.
So verging meineZeit
Die auf Erdenmirgegeben war.
Mein Essen aßichzwischen den Schlachten
Schlafenlegteichmichunter die Mörder
Der Liebepflegteichachtlos
Und die NatursahichohneGeduld.
So verging meineZeit
Die auf Erdenmirgegeben war.
Die Straßenführten in den SumpfzumeinerZeit.
Die SpracheverrietmichdemSchlächter.
Ichvermochtenurwenig.Aber dieHerrschenden
Saßenohnemichsicherer, das hoffteich.
So verging meineZeit
Die auf Erdenmirgegeben war.
Die Kräftewarengering. Das Ziel
Lag in großerFerne
Es war deutlichsichtbar, wennauchfürmich
Kaumzuerreichen.
So verging meineZeit
Die auf Erdenmirgegeben war.
III
Ihr, die ihrauftauchenwerdetaus der Flut
In der wiruntergegangensind
Gedenkt
Wennihr von unserenSchwächensprecht
Auch der finsterenZeit
Der ihrentronnenseid.
Gingenwirdoch, öfterals die Schuhe die
Länderwechselnd
Durch die Kriege der Klassen, verzweifelt
Wenn da nun Unrecht war und keineEmpörung.
Dabeiwissenwirdoch:
Auch der Haßgegen das Unrecht
Macht die Stimmeheiser. Ach, wir
Die wir den Boden bereitenwolltenfürFreundlichkeit
Konntenselbernichtfreundlich sein.
Ihraber, wennes so weit sein wird
Daß der Mensch dem Menschen einHelferist
Gedenktunsrer
MitNachsicht.
No Futuro
(Carol G. Armstrong:
artista norte-americana)
Aos que Vão Nascer
I
Realmente, eu vivo
num tempo sombrio.
A inocente palavra é
um despropósito. Uma fronte sem ruga
denota
insensibilidade. Quem está rindo
é só porque não
recebeu ainda
a notícia terrível.
Que tempo é este em
que
uma conversa sobre
árvores chega a ser falta,
pois implica silenciar
sobre tantos crimes?
Esse que vai cruzando
a rua, calmamente,
então já não está ao
alcance dos amigos
necessitados?
É verdade: ainda
ganho o meu sustento.
Porém, acreditai-me:
é puro acaso. Nada
do que faço me dá
direito a isso, de comer a fartar-me.
Por acaso me poupam.
(Se minha sorte acaba,
estou perdido.)
Dizem-me: – Vai
comendo e vai bebendo! Alegra-te com o que tens!
Mas como hei de comer
e beber, se
o que eu como é
tirado a quem tem fome, e
meu copo d’água falta
a quem tem sede?
Contudo eu como e
bebo.
Eu bem gostaria de
ser um sábio.
Nos velhos livros
consta o que é sabedoria:
manter-se longe das
lidas do mundo e o tempo breve
deixar correr sem
medo.
Também saber passar
sem violência,
pagar o mal com o
bem,
os próprios desejos
não realizar e sim esquecer,
conta-se como sabedoria.
Não posso nada disso:
realmente, eu vivo
num tempo sombrio!
II
Às cidades cheguei em
tempo de desordem,
com a fome imperando.
Junto aos homens
cheguei em tempo de tumulto
e me rebelei com
eles.
Assim passou-se o
tempo
que sobre a terra me
foi concedido.
Minha comida
mastiguei entre refregas.
Para dormir deitei-me
entre assassinos.
O amor eu exercia sem
cuidado
e olhava sem
paciência a natureza.
Assim passou-se o
tempo
que sobre a terra me
foi concedido.
As ruas do meu tempo
iam dar no atoleiro.
A fala denunciava-me
ao carrasco.
Bem pouco podia eu,
mas os mandões
sem mim sentiam-se
mais garantidos, eu esperava.
Assim passou-se o
tempo
que sobre a terra me
foi concedido.
Minguadas eram as
forças. E a meta
ficava a grande
distância;
claramente visível,
conquanto para mim
difícil de alcançar.
Assim passou-se o
tempo
que sobre a terra me
foi concedido.
III
Vós, que vireis na
crista da maré
em que nos afogamos,
pensai,
quando falardes em
nossas fraquezas,
também no tempo
sombrio
a que escapastes.
Vínhamos nós então
mudando de país mais do que de sapatos,
em meio às lutas de
classes, desesperados,
enquanto apenas
injustiça havia e revolta nenhuma.
E entretanto
sabíamos:
também o ódio à
baixeza
endurece as feições,
também a raiva contra
a injustiça
torna mais rouca a
voz. Ah, e nós,
que pretendíamos
preparar o terreno para a amizade,
nem bons amigos nós
mesmos pudemos ser.
Mas vós, quando
chegar a ocasião
de ser o homem um
parceiro para o homem,
pensai em nós
com simpatia.
Referências:
Em Alemão
BRECHT, Bertolt. An die nachgeborenen. In: PROOST, Kristel; WINKLER, Edeltraud
(Hrsg.). Von intentionalität zur bedeutung konventionalisierter zeichen:
festschrift für Gisela Harras zum 65º geburtstag. Tübingen, GE: Gunter Narr Verlag,
2006. s. 258-260. (‘Studien zur Deutschen Sprache’ - Forschungen des Instituts für
Deutsche Sprache)
Em Português
BRECHT, Bertolt. Aos que vão nascer.
Tradução de Geir Campos. In: GULLAR, Ferreira (Organização e Traduções). O
prazer do poema: uma antologia pessoal. Rio de Janeiro, RJ: Edições de
Janeiro, 2014. p. 250-253.
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